quarta-feira, 17 de junho de 2009

Sobre Euskal Herria

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Tive que escrever um trabalho, ontem, para uma optativa do curso de Relações Internacionas da PUCSP sobre Terrorismo. Obviamente, escolhi o País Basco. Foram aproximadamente 10 mil caracteres e em algum momento tive que traçar um paralelo da questão com o filme "A Batalha de Argel". Não ficou grande coisa mas.... É um resumo sobre o País Basco atual.

Vai o texto:

A Farsa da Democracia Espanhola

Nos últimos anos, a Espanha vem seguidamente ilegalizando opções políticas no País Basco (Euskal Herria) e ao mesmo tempo sofre diversas condenações por parte do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o que, na prática, não faz muita diferença para o Estado que se recusa a reconhecer os erros e persiste nos mesmos.

Denúncias de prisões ilegais e tortura são lugar comum na Espanha. Recentemente o ex-preso político Jon Anza “desapareceu” sem deixar qualquer rastro e, se por um lado qualquer cidadão do País Basco sabe que a responsabilidade por tal “sumiço” recai sobre o governo Espanhol, por outro este mesmo governo declara não saber de nada. Neste momento Jon Anza provavelmente está morto ou está sendo torturado pelas Forsas de Segurança Espanholas.

O Relator da ONU, Martin Sheinin, afirmou em entrevista ao periódico Basco “Berria” que são raros os casos de tortura que são investigados pela Espanha e que os delitos enquadrados como “terrorismo” são por vezes absurdos e sem qualquer relação com qualquer definição conhecida e que isso abre precedentes perigosos e também acaba por permitir a ilegalização da opinião de pelo menos 20% da população Basca.

Neste começo de mês, a Iniciativa Internacionalista, ligada à chamada Esquerda Abertzale – Esquerda Nacionalista – conseguiu superar o bloqueio institucional e concorrer às eleições européias (inicialmente a formação havia sido ilegalizada mas na última hora pôde concorrer) e conseguiu, apenas no País Basco e Navarra, mais de 137 mil votos, nacionalmente os votos superaram os 175 mil, demonstrando a força do Nacionalismo Basco de esquerda.A formação não conseguiu nenhuma cadeira no parlamento porém assim que apurados os votos denúncias – comprovadas – de fraude apareceram na imprensa. Era claro que a Iniciativa Internacionalista havia sido prejudicada.

Só em Euskal Herria quase 2 mil votos haviam sido desviados da II para partidos desconhecidos e em outros locais da Espanha centenas, quiçá milhares de votos foram desviados. O governo Espanhol, interessado máximo em manter a mordaçao Povo Basco, se recusa a permitir a recontagem dos votos nulos – que chegou a um nível nunca visto antes, o que levanta suspeitas – e do estrangeiro, que de mais de 50 mil, apenas cerca de 2 mil foram considerados válidos.

Apenas com os votos contados até agora, sob a supervisão do governo Espanhol, sem contar os demais possíveis fraudados, pode-se ver um cenário esclarecedor no País Basco e em Navarra, onde a Iniciativa Internacionalista, e consequentemente a Esquerda Abetzale surgem como terceira força em Euskal Herria (superando o PP e ficando atrás apenas do PNV e do PSOE), terceira força em Navarra (atrás do PP e PSOE) e sétima força na Espanha, o que demonstra irremediável e indiscutível apóio Basco à formação, à independência e ao direito de decidir.

Vale salientar, porém, que a mera possibilidade da Esquerda Abertzale concorrer já foi uma tremenda vitória pois podemos lembrar da lista de partidos até aqui ilegalizados sob acusação de pertencer à ETA ou à sua base de sustentação :

  • ANV-EAE (Acción Nacionalista Vasca - Eusko Abertzale Ekintza, fundada anos anos 30)
  • Askatasuna (Liberdade)
  • EHAK-PCTV (Partido Comunista de las Tierras Vascas - Euskal Herrialdeetako Alderdi Komunista)
  • Aukera Guztiak (Todas las Opciones)
  • AuB (Autodeterminaziorako Bilgunea - Punto de encuentro para la autodeterminación)
  • Batasuna (Unidad, principal partido Abertzale por anos, sob os nomes de Batasuna e Herri Batasuna)
  • HZ (Herritarren Zerrenda - Lista de conciudadanos)
  • D3M (Demokrazia Hiru Milioi - Democracia 3 Milhões)

Esta extensa lista da Esuqerda Abertzale ilegalizada corrobora as denúncias do Relator Scheinin, de que a Espanha sistematicamente censura o povo Basco.

Por outro lado é válido notar que a pecha de “terrorista” jamais recai sobre os partidos institucionais, os partidos Espanhóis, como PSOE e PP. Se por um lado a justiça espanhola não demora em ilegalizar opções Bascas sob acusação de Terrorismo, mesmo que não consiga provar qualquer ligação entre os partidos e a ETA (vale lembrar que o motivo principal para todas as ilegalizações foi o fato de que as formações não repudiavam os atentados da ETA, ou seja, não apoiavam, tampouco condenavam, mantiam o silêncio), por outro não encontra qualquer problema em referendar a participação do partido que apoiou uma ditadura franquista e é saudoso desta (caso do partido fascista PP) e nem o partido que assumidamente financiou o grupo terrorista GAL e o Batallón Vasco Español, grupos terroristas especializados em matar lideranças Bascas de Esquerda nos anos 80, financiados integralmente pelo PSOE de Filipe Gonzáles.

Em momento algum a justiça espanhola pensou em ilegalizar nem PP, nem PSOE por seu apóio reconhecido ao Terrorismo estatal e de grupos para-estatais. Ainda sobre a ilegalização de partidos Bascos, cabe ainda lembrar algo que soa à anedota, a formação Askatasuna foi ilegalizada por uma confusão, os juristas espanhóis confundiram a formação política recém-criada com o grupo de apoio à presos políticos de mesmo nome, que havia sido ilegalizado no ano anterior (2007). Baseada em uma farsa e uma confusão, a justiça espanhola ilegalizou outro partido. Uma das razões ainda para a ilegalização do D3M, na mesma época que o Askatasuna foi o fato de alguns membros isolados da formação terem visitado presos políticos há mais de 20 anos ou, pior, de terem participado de manifestações legais pela independência do País Basco nos últimos 30 anos.

A questão das ilegalizações será analisada pelo Tribunal Europeu de direitos Humanos em Estrasburgo, depois de anos de tentativas.Os casos emblemáticos da ilegalização do Batasuna e Herri batasuna serão analisados ainda este ano.

É fácil fazer um paralelo entre a causa Basca e a guerra de independência Argelina, como visto no filme A Batalha de Argel, onde em ambos os casos encontramos denúncias sérias de tortura, de incomunicação em prisões clandestinas, de falta de democracia, de impossibilidade da participação de partidos políticos nacionalistas em eleições, de fraudes eleitorais, de acusações torpes por parte de um governo colonial contra um grupo nacionalista tachado de terrorista (caso da ETA, Euskadi Ta Askatasuna) e etc.

É emblemático o paralelo na questão colonial, tanto a Argélia quanto o País Basco são colônias, dominadas por potências estrangeiras em que a liberdade de expressão é limitada por leis ditatoriais, o país é governado por partidos e grupos estrangeiros (o País Basco é governado hoje pelo PSOE, depois da ilegalização final da Esquerda Abertzale) e em ambos ou existem grupos que resolveram pegar em armas para defender seu direito legítimo à autodeterminação e ambos foram e são taxados de terroristas em uma tentativa de destruir o movimento e a força popular.

A ETA diz claramente que abandonará as armas caso a política de torturas, ilegalizações e repressão contra o povo Basco tiver fim e quando todas as opções políticas estiverem na mesa de negociação e que, no fim, seja dado ao povo Basco o direito de decidir seu caminho.


A repressão à nacionalidade Basca chegou ao ponto de rebaixar novamente o Euskera ou Euskara, proibindo que este seja usado como principal veículo de comunicação. É o golpe de misericórdia da Espanha e sua justiça contra o povo Basco. Atualmente a Presidente do Parlamento Basco, a fascista Arantza Quiroga, do PP sequer fala Euskara e todos os seus pronunciamentos são feitos em Espanhol, língua do invasor.

Por fim, vale salientar que o ex-relator das Nações Unidas sobre a tortura, Theo Van Boven enviou uma Declaração à Coordinadora contra la Tortura, a propósito do início do julgamento 15/02 (contra Bascos acusados de violência, pertencimento è ETA e etc, o mesmo de sempre) que teve início 28 de Maio, na Audiência Nacional espanhola, condenando a forma como estava sendo levado o processo e condenando o processo como um todo.

Enquanto foi relator da ONU para a Tortura, Van Boven já havia denunciado a Espanha por suas práticas de incomunicação, tortura, repressão, desaparecimentos e prisões arbitrárias.

A Amnistia Internacional é outra que condena as práticas de tortura, incomunicação e prisões ilegais contra a população Basca.

Enfim, é possível ver como a Espanha passa para o mundo, uma imagem de nação democrática, que concilia todas as suas minorias de forma única mas, quando analisada mais de perto, vemos que é um Estado onde a democracia não é uma regra, onde a prática de tortura é alarmante, diária, onde a prática política vale apenas para poucos e a fraude eleitoral é usada como arma política costumeiramente.

Sob a fachada de democracia a Espanha busca silenciar a nacionalidade Basca e as constantes condenações por parte da ONU e de tribunais Europeus não surtem qualquer efeito prático e que a democracia não passa de ficção.

Nas últimas semanas ainda, foi possível compreender um pouco mais das intenções da Espanha em amordaçar o nacionalismo Basco, várias Euskal Etxeas, ou casas bascas, assim como Herriko Tabernas, ou bares nacionalistas, foram invadidos sem qualquer aviso pela polícia – Ertzaintza – que espancou e intimidou os que por lá estavam, na busca por “material ilegal” que significa apenas fotos de presos políticos – parentes e amigos dos freqüentadores dos locais – para rasgá-las e destruir o local. Quem resistia era duramente espancado, preso e ameaçado.

Um último caso de nota é a condenação à um ano de prisão e 7 sem direitos políticos da prefeita de Hernani, Marian Beitilarrangoitia, condenada por ter pedido uma salva de palmas à dois presos políticos – Igor Portu e Mattin Sarasola – que foram torturados pela polícia Espanhola e são acusados de pertencerem à ETA. O mais curioso da situação éque a mesma justiça espanhola concordou em julgar os policiais envolvidos na prisão dos dois por práticas de tortura, referendado as palavras de Beitilarrangoitia que é acusada de fazer apologia ao terrorismo num simples pedido de palmas e solidariedade com dois nacionalistas.

Como é possível observar, as potências coloniais se valem sempre das mesmas desculpas e mesmos instrumentos para buscar silenciar a população oprimida de suas colônias: tortura, prisão ilegal, processos ilegais e sem fundamentação, ilegalizações, censura e intimidação.

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