quarta-feira, 18 de março de 2009

Fisk e a extrema-direita em Israel

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Avigdor Lieberman é a pior coisa que poderia acontecer ao Oriente Médio


18/3/2009, Robert Fisk, The Independent, UK

http://www.independent.co.uk/opinion/commentators/fisk/robert-fisk-why-avigdor-lieberman-is-the-worst-thing-that-could-happen-to-the-middle-east-1647370.html

Apenas poucos dias depois de terem rugido, furiosos com os sucessos do lobby israelense que escalpelou o falante Charles Freeman e o despachou antes de assumir o cargo de Inteligência para o qual o governo Obama o convidara, os árabes agora têm de lidar com um ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel e seus – falemos francamente – comentários racistas sobre 'testes de lealdade' para os palestinos, introduzidos no novo governo de Netanyahu por um dos mais desagradáveis políticos de todo o Oriente Médio.

Os iraquianos produziram o odioso Saddam; os iranianos, o caricato Ahmadinejad – por motivos de sanidade, nem falo do grotesco ditador da Líbia. Agora, os israelenses trazem à cena um homem, Avigdor Lieberman, que supera os Sharons, até Ariel Sharon.

Alguns palestinos manifestaram um prazer cruel, porque, afinal, o Ocidente conhecerá "a verdadeira face" de Israel. Já ouvi essa há tempos – quando Sharon tornou-se primeiro-ministro – e o nonsense de sempre dizia que só um "extremista linha-dura" conseguiria negociar com os palestinos.

Esse tipo de auto-engano é uma doença no Oriente Médio. O fato é que o primeiro-ministro indicado de Israel já declarou, bem claramente, que não haverá Solução de Dois Estados; e já plantou uma árvore no Golan, para mostrar aos sírios que Israel não arredará pé de lá. Agora, traz para o governo um homem para o qual os árabes israelenses são cidadãos de segunda classe.

A primeira visita de Lieberman a Washington será imperdível. O AIPAC – que posa como lobby israelense, quando de fato trabalha para o Partido Likud – lutará por Lieberman, e Lady Hillary terá de sorrir para ele no Departamento de Estado. Sabe-se lá, talvez Lieberman sugira a Hillary que institua um teste de lealdade para as minorias nos EUA – o que implicará obrigar Barack a jurar fidelidade aos brancos. E a coisa por aí vai, sem fim.

No Egito, Avigdor Lieberman enfrentará briga mais dura. Hosni Mubarak é gentil com os norte-americanos, mas não esquece que Lieberman disse que o presidente do Egito tinha obrigação de visitar Israel "ou que fosse para o inferno". Lieberman ofendeu gravemente um homem que arriscou muito para manter a paz entre Israel e o Egito.

Os egípcios também sofreram o ultraje de ler nos jornais que Lieberman falara sobre afogar os palestinos no Mar Morto e sobre executar os palestinos-israelenses que se reunissem com o Hamás. Ontem à noite, um apoiador de Lieberman, entrevistado pela rede Al-Jazeera de televisão, descreveu o Hamás como "organização antissemita bárbara" – apesar dos vários altos oficiais do exército israelense que se reuniram com os supostos "bárbaros" antes e depois do acordo de Oslo.

Mas o fortalecimento desse governo extremista em Israel e a nenhuma resposta do governo Obama aos ditos apoiadores de Israel que destruíram a carreira de Freeman parecem ser notícias perigosas só para o Oriente Médio.

O jornal Arab News, de Jeddah, chamou o desastre de Freeman de "grave derrota para a política exterior dos EUA".

A imprensa árabe em geral, ao mesmo tempo em que enuncia as platitudes de sempre, tem dado destaque à resposta acovardada do secretário de imprensa de Obama, Robert Gibbs, ao ser perguntado por que Obama não se manifestara no caso Freeman. "Tenho observado com grande interesse o modo como as pessoas percebem coisas diferentes sobre nossa política e durante a campanha, sobre se estamos mais próximos de um grupo ou de outro. Não estamos preocupados com isso." Quando lhe pediram "respostas diretas", Gibbs disse: "Dei-lhes a resposta mais direta possível."

Foi quase tão engraçado quanto o The New York Times, semana passada, tentando explicar por que Lady Hillary mostrara tanto medo de ofender os israelenses durante o processo de formação do governo de Netanyahu, quando ela disse que a destruição de 1.000 casas de palestinos seria movimento que "não contribui".

O cuidado em relação ao Oriente Médio seria, explicou o NYT, "reflexo da paisagem traiçoeira no Oriente Médio, quando uma frase mal posta faz rufar penas também entre deputados e senadores nos EUA." Que as penas rufam, rufam – e quando Lieberman chegar por lá, veremos quais são as penas mais rufantes.

As mesmas penas rufantes, contudo, melhor fariam se se preocupassem com a linguagem incendiária de Avigdor Lieberman. Ele fala como um russo nacionalista, não como o israelense secular que diz ser.

Eu cobri os massacres da Bósnia no início dos anos 90s e sei ver que a linguagem de Lieberman – de execuções, afogamento, o inferno dos juramentos de lealdade – é idêntica à linguagem dos Mladic e Karadzic e Milosevic.

Lady Hillary e seu chefe deveriam ler alguma coisa sobre a guerra na ex-Ioguslávia, para conhecer melhor os tipos com os quais estão negociando. Responder que eles "não contribuem" jamais será resposta adequada.


Via Vi o Mundo

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