De fazer inveja ao Granma
Reproduzo, abaixo, a coluna do ombudsman do jornal Folha de São Paulo extraída, neste sábado 14 de março, de sua edição impressa deste domingo dia 15, coluna que será sucedida por meu comentário sobre ela.
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Folha de São Paulo
15 de março de 2009
De empastelamentos a reconhecimento de erros
por Carlos Eduardo Lins da Silva, ombudsman
Não faz muito tempo, alguém que discordasse das opiniões expressas por um jornal podia juntar uma turba e destruí-lo fisicamente.
A isso se chamava “empastelamento”. Este jornal, quando era “Folha da Manhã” e “Folha da Noite”, foi vítima de tal agressão em 1930.
No sábado, dia 7 passado, um grupo de 300 pessoas (segundo o jornal) ou pelo menos 450 (de acordo com os organizadores) realizaram [Sic] manifestação em frente à Folha.
Elas se diziam indignadas com editorial publicado em 17 de fevereiro com menção à ditadura brasileira (1964-1985), chamada de “ditabranda”.
O ato, com número de participantes que evidencia tanto o poder de convocação dos promotores do evento quando [Sic] a importância do jornal, foi pacífico. A Folha o noticiou no domingo e deu na íntegra manifesto lido ali.
Faz muito pouco tempo, veículos de comunicação nunca reconheciam seus erros. A Folha foi o primeiro no Brasil a ter seção fixa para eles.
No domingo, pela primeira vez que eu tenha memória, um jornal admitiu erro de opinião. Foi a Folha, neste episódio.
Isso demonstra como avançou a relação entre imprensa e sociedade neste país.
A propósito, leitores registraram que a “Nota da Redação” em resposta a carta de Fábio Konder Comparato em 20 de fevereiro continha erro factual.
É verdade: ela dizia que Comparato não havia “até hoje” manifestado repúdio a ditaduras de esquerda como a de Cuba. Em 1º de junho de 2004, o “Painel do Leitor” publicou carta dele com críticas ao regime cubano.
Minha opinião:
Para começar, acho lamentável que o Carlos Eduardo Lins da Silva, com quem mantive quatro contatos presenciais, sugira qualquer coisa parecida com “empastelamento” de jornais para aludir ao Ato público solene, pacífico e organizado que o Movimento dos Sem Mídia promoveu no último dia 7.
Até podemos discutir a relevância secundária dada pelo ombudsman a um ato público contra um jornal, ocorrência marcada sobretudo pelo ineditismo. Prioridade jornalística é algo que se pode argumentar, com certa dificuldade neste caso, que é subjetiva.
Mas o tom misterioso impresso pelo jornalista ao seu comentário sobre o ato do MSM, sobre seus organizadores e sobre as queixas e argumentos dos manifestantes, simplesmente incorre naquilo que a Folha tanto critica em regimes como o cubano: controle da informação.
Aliás, a falta de qualquer imagem da manifestação na reportagem de domingo passado da Folha bem que poderia ter merecido alguma menção, ainda que ao jornal possa parecer que já estou querendo demais.
A verdade é que o jornal e seu ombudsman – o que é mais grave – parecem achar natural o direito que se arrogam de decidirem quanto de informação o leitor deve ter...
Lins da Silva ainda incorreu num erro factual que revela pouco cuidado seu na apuração do fato que comentou, ao dizer que o manifesto do Movimento dos Sem Mídia lido diante da Folha foi reproduzido “na íntegra” pelo jornal.
Para informação do ombudsman, o que foi reproduzido “na íntegra” pela Folha no domingo passado foi o teor do abaixo-assinado na internet contra o editorial daquele veículo que desencadeou tudo.
Vale registrar que Manifesto do MSM lido diante da sede a Folha sábado passado foi absolutamente ignorado por ela, apesar de eu ter dado cópia do documento ao jornalista Fernando Melo, enviado pelo jornal para “cobrir” o evento.
Quanto à opinião de Lins da Silva de que o episódio denotaria algum tipo de “avanço” na relação entre a imprensa e a sociedade, acho que centenas de pessoas terem que promover um ato público em frente a um jornal para conseguirem alguma reação sua, decorre justamente de problemas nessa relação.
Por fim, espanta-me que um jornal noticiar, de forma truncada, com falta de montes de informações, um ato público de centenas de pessoas diante de sua sede seja considerado mais do que mera obrigação de uma empresa que se propõe a informar as pessoas.
O ombudsman anterior
Reproduzo, abaixo, crítica interna do ex-ombudsman da Folha de São Paulo Mário Magalhães, que versou sobre o primeiro Ato que o Movimento dos Sem Mídia fez diante da Folha, em 15 de setembro de 2007.
Vale lembrar que Magalhães foi defenestrado da Folha quando suas críticas começaram a se tornar mais intensas e frequentes. Na verdade, ele pediu demissão, mas foi porque tentaram tolher seu trabalho.
A crítica interna de Magalhães foi publicada em seu extinto site na internet dois dias depois do primeiro ato dos Sem Mídia, em 17 de setembro de 2008
Espero que a postura do corajoso ex-ombudsman sirva de referência ao atual.
"Sem-mídia"
por Mário Magalhães, ombudsman da Folha
A reportagem "Em São Paulo, protesto contra absolvição de Renan reúne 200" (pág. A6 do domingo) contou no pé, em 15 linhas, que na véspera houve uma manifestação diante da sede da Folha. Promoveu-a o "Movimento dos Sem Mídia". Foi protocolado na portaria do jornal um manifesto "endossado por cerca de 190 pessoas". Por que a reportagem não informou qual o conteúdo do manifesto? Quem participa do movimento? Havia faixas no ato, como na manifestação contra Renan? Se havia, o que diziam? Em espaço noticioso, não cabe ao jornal ser contra ou a favor da mobilização, mas apenas reportar. Os leitores precisam de informações para formar opinião. Na reportagem de domingo, foi isso que faltou: informação. ----------------------------------- Definitivamente um absurdo a posição da Folha. Reconhecer um erro é dificil e a Folha o fez a contragosto e sempre cercada de "poréns". O frias reconhece que "ditabranda" talvez seja demais, mas ao mesmo tempo afirma que a ditadura foi mesmo "branda". Pedido de desculpas bem estranho. O Ombudsman remonta aos anos 30, uma época BEM diferente da atual para fazer paralelos absurdos com o MSM e seu protesto contra as mentiras deslavadas da Folha... No finzinho da mensagem aparentemente se lembra "ops, realmente, o Comparato deve ter dio alguma coisa há algum tempo, desculpem meu erro!".... Temerário!