Fundado
em 2006 na Catalunha sob o nome de "Ciutadans de Catalunya", uma
plataforma cívica que logo deu origem ao partido "Ciudadanos, partido de
la ciudadania" presidido por Albert Rivera, antigo membro das juventudes do PP, partido de
(extrema) direita ainda no poder na Espanha (o PP ainda governa de forma
transitória até que um novo governo seja formado após as eleições de hoje, 26 de junho).
Em pouco
menos de 10 anos de atividade o partido de minoritário em sua região original
passou a disputar as primeiras posições em diversas pesquisas eleitorais no
âmbito espanhol, pese sua popularidade não ter, até então, se convertido em votações
suficientes para alcançar o primeiro lugar e, nas últimas eleições regionais
(2015), ter conseguido uma votação inferior à necessária para influenciar
significativamente a formação dos governos regionais e das principais capitais
espanholas - mas com musculatura suficiente para se aventurar no processo de
eleição do presidente do governo espanhol.
Nem de
direita, nem de esquerda... E sem dúvida nem de centro
O
Ciudadanos se coloca como partido de centro, mesmo de centro-esquerda, pese na
prática o quadro ser significativamente (ou mesmo radicalmente) diferente.
Diversas lideranças do partido possuem passagens pelo PP ou mesmo por partidos
ainda mais direitistas ou mesmo falangistas (ideologia professada por Francisco
Franco). Por vezes se declaram liberais e efetivamente muitos de seus quadros -
como muitos do PSOE - acabam por defender, ainda que timidamente e muitas vezes
de forma ambígua, agendas progressistas, como a laicidade do Estado ou o
direito ao aborto, porém se colocam à direita em questões econômicas, tendo
mais afinidades com o PP que com o PSOE - pese se oferecerem para formar
alianças com ambos, visando chegar ao poder de qualquer forma e denunciando sua
falta de base ideológica.
Rivera e
outras lideranças partidárias modulam seus discursos sociais para cada
audiência, seja na questão do aborto, na questão da imigração ou mesmo em
relação às touradas. Em abril de 2014, por exemplo, o Ciudadanos foi o único
partido a, junto com o PP, defender a limitação ao acesso à saúde a imigrantes
ilegais no parlamento da Catalunha, assim como propôs a proibição do uso de
burka.
A única
base, porém, sólida do grupo é a da defesa da unidade da Espanha e a negação do
direito de autodeterminação de catalães, bascos, galegos e outros povos presos
na colcha de retalhos étnica que é o Estado espanhol. Pese sua origem catalã,
chegam a se unir em manifestações com partidos da mais radical extrema-direita
em manifestações contra a independência desta região (ou nação) da Espanha. Uma
das mais significativas críticas feitas pela esquerda à formação é exatamente a
facilidade com que se juntam ou mesmo aliam com forças de direita e
extrema-direita a fim de conseguir seus objetivos e para promover sua
propaganda. O partido professa ainda abertamente ideais individualistas, de
"cultura do esforço" e um Estado mínimo, uma receita que apenas
aumentaria a desigualdade em um país já assolado por crises sociais e
políticas.
Mas
existem outras críticas.
O partido
se orgulha de declarar-se "nem de esquerda e nem de direita", mas
diferentemente do Podemos e de seu líder Pablo Iglesias (que chegou a dar
declarações semelhantes), suas posições são nitidamente de direita e
neoliberais. O partido não questiona o sistema, mas o sustenta, e nisto se
diferencia enormemente das bases fundamentais do Podemos, partido
constantemente comparado com o Ciudadanos, pese as poucas semelhanças.
O partido
se diferencia do PP apenas de forma cosmética. Algumas poucas questões voltadas
à liberdades individuais, visto que o PP é um partido de caráter mais
conservador. Poderíamos dizer que ao invés de um terno italiano feito por um
alfaiate usado por um membro do PP, o membro do Ciudadanos usaria um blazer,
camisa polo e sapato da Osklen. No fim a mesma elite, a mesma
"casta", porém com uma cara mais moderna e palatável às novas
audiências. O Ciudadanos agrega elementos liberais ao caldo conservador do PP.
De certa forma se complementam.
Este
liberalismo acaba também por aproximar o partido do PSOE, que a cada dia migra
mais para o centro e menos se diferencia de muitas das políticas pró-mercado do
PP.
Em linhas
gerais o Ciudadanos se apresenta apenas como uma versão mais nova do PP, com
uma cara mais light e com uma história menos ligada à ditadura, com uma
militância mais nova que em muitos casos lembra os grupelhos pseudo-liberais
brasileiros sempre prontos a apoiar as políticas mais reacionárias
possíveis. O Ciudadanos seria o sonho de consumo da "nova"
direita ligada à "escola austríaca", uma direita em muitos aspectos
mais perigosa que a atualmente no poder.
O
Ciudadanos vem ocupar o lugar do UPyD (União, Povo e Democracia), um partido
muito semelhante, porém com menos apelo popular que o primeiro e que vem
minguando exatamente pela ascensão do partido de Rivera. Muitos de seus
quadros, como era de se esperar, migraram para o Ciudadanos. Em muitos casos,
os quadros mais radicais.
Não
apenas o seu presidente, Albert Rivera, fez parte do PP (pese por muito tempo
ele ter negado seu passado), mas a coordenadora do partido em Extremadura,
Victória Domínguez, fez parte do PP e do regionalista de direita UPEX. Em
Viladecans, na comarca de Baix Llobregat, o militante e candidato do partido
Manuel García Florido saiu do partido e migrou para o xenófobo Plataforma Per
Catalunya (PxC), do falangista Josep Anglada que, ainda, declarou que todos os militantes do
Ciudadanos na cidade haviam migrado para seu partido. O coordenador de suas
juventudes em Madri, Carlos
López Martín -
posteriormente expulso - ficou conhecido por uma série de tuítes
preconceituosos e por sua proximidade com movimentos falangistas, assim como
eram falangistas três dos cinco dirigentes do partido em Getafe. Francisco
Gambarte, ex-candidato à presidência da região de Astúrias foi outro que, no
twitter, declarou que "limparia a bunda" com a bandeira catalã.
Diversos outros membros do partido estão sendo investigados (ou foram condenados) por envolvimento em casos de corrupção, o que para uma formação que sequer chegou aos 10 anos de idade demonstra uma vontade tremenda de se apropriar dos cofres públicos.
Diversos outros membros do partido estão sendo investigados (ou foram condenados) por envolvimento em casos de corrupção, o que para uma formação que sequer chegou aos 10 anos de idade demonstra uma vontade tremenda de se apropriar dos cofres públicos.
Resultados
conflitantes
O
Ciudadanos, enfim, se mostra um partido de direita infiltrado por falangistas e
ex-membros do PP que mantém uma posição ambígua ou mesmo claudicante em relação
a temas sociais ao passo que defendem políticas neoliberais no campo econômico.
Porém, o hype em torno do partido se mantém, inclusive com cidadãos de esquerda
apostando pelo partido como uma alternativa ao bipartidarismo PP/PSOE e mesmo
frente ao Podemos que, para muitos, seria muito radical.
Os
resultados das últimas eleições, porém, demonstram que muito do apoio ao
partido acaba por se diluir na hora da votação. Pese terem chegado em quarto
lugar nas últimas eleições espanholas, ajudando a criar um cenário de quase
impossibilidade de se formar um governo estável (com PP vencendo por pequena
margem, PSOE em segundo e o Podemos pouco atrás), a votação do partido foi
muito aquém do esperado - e do investimento feito por parte considerável da
mídia e do "mercado". Nas eleições de 26 de junho de 2016 o resultado do partido provavelmente será inferior à das eleições gerais ainteriores.
O apoio
ao Ciudadanos tem diminuído passado o hype inicial e também, pode-se pensar,
devido ao crescimento de forças locais, municipais e regionais que pese terem
concorrido em conjunto com o Podemos, não fazem parte do partido e mesmo nutrem
críticas em relação à sua forma de se organizar. Não é possível, no entanto,
chegar a um veredito único.
Porém,
uma certeza que fica é a de que tanto os dois partidos tradicionalmente
majoritários, PP e PSOE, começam a perder força ao passo que Podemos e
Ciudadanos tem participado de uma luta própria. Até o momento com o Podemos
saindo-se melhor (numericamente).
A "direita
chic" encarnada pelo Ciudadanos ainda não foi capaz de transformar sua boa
presença nas pesquisas efetivamente em votos e tampouco pôde oferecer seu apoio
a qualquer partido que possa lhes garantir algum poder como sócio, ao menos não
de forma consistente - mas foram bem sucedidos em encantar o PSOE, que nunca teve
problemas em mostrar o quão pouco comprometidos estão com suas bases, sua história
e com a esquerda em geral, e fecharam um acordo para apoiar a posse de Pedro
Sánchez para que este possa governar o país.
Pese o acordo entre PSOE e Ciudadanos, o Podemos pode acabar com segunda força e, então, ter a preferência em uma coalizão com o PSOE que excluiria o Ciudadanos.
Pese o acordo entre PSOE e Ciudadanos, o Podemos pode acabar com segunda força e, então, ter a preferência em uma coalizão com o PSOE que excluiria o Ciudadanos.