quarta-feira, 19 de maio de 2010

O Acordo Brasil-Irã-Turquia

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A celeuma em torno do acordo feito por Irã, Turquia e Brasil é simplesmente lamentável.

Longe de me colocar do lado dos patriotas e ultranacionalistas que bradam de alegria frente ao acordo, colocando o Brasil no céu, como nação da paz e etc, devo dizer que, querendo ou não,  a posição brasileira merece aplausos.

Ao contrário de metade do mundo, que simplesmente engole a cartilha dos EUA e que quer com unhas e dentes promover mais uma guerra e afogar o Irã em seu próprio petróleo, o Brasil soube ser ponderado, proativo e responsável. Celso Amorim é um estrategista e negociador de fazer inveja e o Brasil jogou as cartas certas e conseguiu convencer o Irã a aceitar um acordo nos mesmos moldes do proposto anteriormente pela ONU (via conselho de Segurança) e pelos EUA de que o urânio iraniano seria enriquecido fora de suas fronteiras - dentre outros detalhes.

Notem bem, o Brasil, junto com a Turquia, conseguiu convencer o Irã a aceitar praticamente o MESMO acordo proposto anteriormente e, mesmo assim, os EUA sentem falta de sangue e se recusam a aceitar este acordo.

Os EUA impuseram um acordo com armas na mão, queriam forçar o Irã a se ajoelhar. Como de costume, foram derrotados. O Brasil apresentou acordo semelhante, mas com diálogo, negociação, argumentos, e saiu-se vencedor. A força das armas comumente usada pelos EUA já há muito não vem surtindo efeito.

O Conselho de Segurança está disposto a passar por cima de todo o longo processo de negociação dos últimos meses e do acordo extremamente favorável do Brasil apenas para agradar ao Império.

Os EUA não conseguiram pressionar, assustar ou condenar o Irã, o Brasil, com boa vontade e conversa, conseguiu. O Império, então, se recusa a aceitar que um primo pobre tenha feito seu trabalho, e sem sujar as mãos.

Se o Irã irá efetivamente respeitará este acordo - e aqui sigo o mesmo raciocínio do ministro Celso Amorim - são outros quinhentos. Cabe à ONU e outros organismos zelarem pelo acordo, pela efetividade do que foi assinado ou ao menos acordado. O que interessa saber é que o acordo foi alcançado, com pressão diplomática e negociação, e não com a força das armas ou ameaças inconsequentes.

Infelizmente, vivemos em um mundo de cartas marcadas, enquanto o Brasil negociava, os países que compõem o CS já haviam escrito um documento exigindo que o Irã se ajoelhe, cortando financiamentos, fechando e bloqueando contas e tornando ainda mais difícil a vida dos habitantes do país.

Ao contrário do que se pensa, do senso comum, a aplicação de sanções serve apenas para radicalizar ainda mais a oposição, serve apenas para acirrar ainda mais os ânimos e inviabilizar qualquer tipo de negociação franca e justa. A aplicação de sanções, vale lembrar, prejudica a população, o povo iraniano, não só radicaliza os radicais, mas também aumenta o sofrimento dos que sentem na pele a escassez causada pelos cortes que se seguem à punição.

Talvez eu esteja me adiantando, mas o que vemos é, talvez, o ponto de ruptura do atual sistema internacional. Caminhamos para uma multipolaridade em que nem os EUA e nem a Europa detém o poder máximo de convencimento. De fato, o poder militar final é ainda dos EUA - vide o Iraque, invadido contra a vontade da ONU e da ampla maioria dos países do mundo -, mas o poder moral já não está nas mãos dos EUA ou mesmo da Europa que, em um período em que se esperava um crescimento de sua importância no cenário internacional com a União Européia, à ponto de enfrentar o poderio dos EUA em diversas áreas, se mostra nada mais que um capacho dócil das vontades dos EUA - e a Inglaterra que o diga!

Hoje, os EUA não tem mais o poder de estalar os dedos e ter sua vontade respeitada. Nem a ameaça das armas vem funcionando, vide o Irã ou a Coréia do Norte.

Contra o Iraque foram forçados a invadir o país, o mesmo vale para o Afeganistão em que suas armas não vem ganhando dos Talibãs e seu escolhido para governar, Hamid Karzai, é um fantoche inquieto e pouco confiável. Estamos diante, neste começo de século XXI, se me permitem profetizar, do fim do poderio americano como conhecemos durante boa parte do século XX.
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Comentários
4 Comentários

4 comentários:

Iberê disse...

muito boa a análise!
gostaria apenas de ressaltar uma questão que é abandodana pela grande maioria dos analistas e que torna evidente a necessidade (não digo justificavel) do Irã criar essa pressão internacional baseado em armas nucleares.
A posição geográfica do Irã! Ele se localiza exatamente entre o Afeganistão e o Iraque,que são países ocupados pelos EUA. Além de estar no alcance de fogo (de acordo com as ultimas demostrações) tanto israelita como paquistanesa. Não há país que não se sentiria ameaçado por isso e pensaria em criar pressão internacional. É a famigerada geoestratégia, que no Brasil, infelizmente, foi desenvolvida e aprimorada apenas pelos militares na ditadura. Os textos do golbery sobre geopolítica e estratégia são um primor, todos temos no fundo bem no fundo algo bom tambem.

Ontem a noite no entre aspas do Globo News passou uma pequena discussão sobre o tema, com o Ex embaixador em Washington Barbosa e o Prof. Reginaldo Nasser. Um dos principais pontos defendido pelo Nasser quanto ao Irã estar agindo dessa forma foi justamente a questão geográfica! Discurso o qual já tinha escutado nas aulas dele a cerca de um mês atrás, mas que continua válido.

No final das contas, concordo que o Brasil teve uma ótima atuação, que reforça, apesar de alguns erros como Zelaya, a imagem do Brasil como um ator que tem ganhado importância no SI e o decaimento dos EUA.

Palmas para a diplomacia tupiniquim e a sua demonstração de que não somo ingênuos!
Poliquarpo Quaresmas estaria muito feliz nesse momento!

Raphael Tsavkko Garcia disse...

Exatamente Iberê. Não entrei nesta questão, mas é realmente importante. O Irã está cercado por inimigos e ao alcance de outros inimigos. Além disso é Xiita no meio de inimigos Sunitas e semelhantes e não é Árabe como seus vizinhos do oeste, além de ter rixas históricas com muitos deles.

O livro do Golbery - batendo na maeira 3 vezes - é essencial. Pena que só militares tenham se embrenhado por essa seara, como Terezinha de Castro (não era militar, mas estava junto deles todo tempo) e General Meira Mattos.

O Barbosa é um boçal belicista contaminado pelas crenças estadunidenses, só fala besteira. O Reginaldo, por outro lado, vem se mostrando um grande analista de questões afins.

IL disse...

Muito interessante sua análise a respeito desse assunto, onde todos dizem de tudo, sempre puxando a besa para sua sardinha. A meu ver, os Estados Unidos querem, suspeito, transformarem o Irã no Afeganistão da vez, quando invadiram o país sob a desculpa de que este "arquitetava" planos mirabolantes que teriam como finalidade atacar o povo yankee. Nada ficou provado e as atrocidades impostas sobre o povo afegão por parte da turma do Bush revelou-se gratuita. O Irã que coloque suas barbas de molho.
Forte abraço.
Até a próxima.

Hugo Albuquerque disse...

OS EUA tem problemas. O país perdeu importância relativa na economia mundial desde o fim da Segunda Guerra Mundial e a política belicista apenas favoreceu grupos bastante específicos. Trata-se de um programa suicida, sem dúvida. O ponto é que hoje aquele país não tem mais como manter tamanha atividade bélica nem boa parte de suas inúmeras bases pelo mundo. Não é viável. Mas Obama, como eu já antevia na época das eleições, teria pouca ou nenhuma força para bater de frente com esse interesse - e estaria acossado pela variável matemática do outro lado, as contas americanas não fecham e mesmo tendo o poder de emitir a moeda hegemônica, tudo tem um limite. A posição do Brasil jogou um peso enorme nos ombros da diplomacia americana. Agora, eles estão em xeque, se insistirem na Guerra, ela será um desastre econômica, político e militar maior do que já seria antes. Só espero que isso que o Brasil fez atrase a Guerra o suficiente para que ela não ocorra. Espero que o mundo multipolar seja erigido por vias razoáveis.

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