sexta-feira, 20 de maio de 2011

Educação NÃO é prioridade: Brasil e a falta de investimento em educação

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Há pouco mais de um ano a CAPES e o CNPq permitiram que seus bolsistas encontrassem outra forma de financiamento para poder se sustentar enquanto faziam seus mestrados e doutorados. Esta forma "extra" de financiamento poderia ser outra bolsa ou mesmo trabalho remunerado relevante à sua área (o que é por demais amplo).

Esta iniciativa, ao invés de demonstrar maturidade das organizações citadas, demonstra na verdade a face mais terrível do ensino superior: A falta de investimento na formação de doutores e mestres.

A CAPES e o CNPq não permitiram que o estudante trabalhasse por ser bonzinho, para ter experiência e etc, mas sim porque sabe que os valores pagos pelas bolsas são ridículos. Mas, ao invés de reajustar até um valor minimamente decente, preferiram o caminho mais fácil - para eles -, o de "permitir" que os estudantes desviem sua atenção dos estudos, demorem mais tempo para concluir dissertações e teses e, em muitos casos, sejam até cooptados pela iniciativa privada.

São pagos pelo governo, com dinheiro público, mas acabam na iniciativa privada, muitas vezes sequer ensinando.

O Brasil tem uma carência imensa de professores qualificados e, mais ainda, de qualidade no ensino em todos os níveis. O ensino básico brasileiro é uma lástima. Salários baixíssimos afastam os melhores professores, restando só heróis dedicados ou então aqueles com pior formação ( o Marcos Bagno, em recente artigo para a Caros Amigos, analisou bem o drama dos professores que não tem boa formação). Isto sem falar na falta de condições básicas que vão além da formação do professor, como falta de merenda, estrutura e até mesmo de giz! No caso de São Paulo os professores ainda recebem apostilas com erros grotescos.

Quando chegamos à universidade, tomamos conhecimento do ProUni que, por um lado permite a estudantes que muitas vezes vem de uma educação deficitária (ainda que, felizmente, consigam notas superiores a dos não-bolsistas, o que é maravilhoso) tenham acesso à universidades de elite.

Infelizmente, o ProUni também dá acesso a UniEsquinas, que apenas perpetuam a péssima qualidade do ensino. Faculdades péssimas que não conseguem formar devidamente professores para o futuro. são os dois lados do ProUni.

Para os sobreviventes que querem seguir além, resta tentatar bolsas de mestrado e doutorado que, em geral, não dão nem pra pagar as contas.

Somos um país em que o salário mínimo ainda é muito baixo, e cujas bolsas de mestrado e doutourado são igualmente péssimas, ainda que bem maiores que o mínimo. São insuficientes, risíveis se esperamos por uma formação decente.

1200, 1500 reais para dedicação exclusiva, para comprar livros (nem tudo que precisamos tem ou pode ser encontrado em bibliotecas, lembrando que estas são péssimas e incompletas em muitas universidades), pagar as contas, para transporte, alimentação e tudo mais.

É praticamente impossível, sem bicos ou trabalhos sem carteira (ou ainda ajuda da família) conseguir completar os estudos dignamente. Tenho colegas que desistiram dos cursos por não conseguir bolsas ou pelo valor destas ser baixo demais para pagar as despesas. Perdemos bons futuros professores pela ineficiência do governo em investir em educação com seriedade. Do governo digo TODOS os governos que tivemos até hoje.

Lula construiu dezenas de novas universidades, mas não investiu em meios para que futuros professores se mantenham em seus cursos e possam renovar o professorado. Investiu em acesso à universidade, mas não fez distinção entre universidades e UniEsquinas.

Como esperar que o Brasil tenha nível acadêmico se não há investimentos sérios tanto em educação básica quanto em formação de professores e de uma academia forte e consistente? Só tivemos investimentos no centro da cadeia, na metade da formação, na graduação. Sem qualquer continuidade ou preocupação com a continuidade, dando a entender que o objetivo era a formação de mão de obra para a ampliação do poder de compra baseado no consumo (carro-chefe do governo) e não de acadêmicos para a reprodução do ciclo virtuoso do ensino.

Irônico quando lemos a declaração de Dilma, ainda candidata, em 2010, de que iria quadruplicar o número de mestres e doutores no Brasil. Ela até pode conseguir o número, mas não podemos falar em qualidade.

“Não sei se é um número desafiador, mas acho que é uma meta possível, de 220 mil pesquisadores, mestres e doutores”
Pelo visto, apenas mais uma promessa vazia que candidatos fazem sempre. Falar ainda em "pesquisadores', parece piada. Não há qualquer incentivo sério à pesquisa no Brasil. Primeiro, há a questão cultural, em que pesquisadores, mestrandos e doutorandos são vistos como vagabundos por muita gente, porque "não trabalham" e este preconceito parece ter pego tanto a CAPES quanto o CNPq, que "permitiram" aos estudantes trabalhar para complementar sua renda.

Só pode ser mesmo uma piada de mal gosto.

E, surpreende ainda que o mesmo governo, via suas agências CNPq e CAPES, tenham agora resolvido piorar ainda mais a vida de seus bolsistas, ameaçando retirar bolsas de quem acreditou na "ajudinha" do governo em "permitir" acúmulo de funções, bolsas e emprego
Educação nunca foi prioridade no Brasil, mas agora estamos chegando ao fundo do poço. A CAPES e o CNPQ, em uma atitude arbitrária e injustificável, estão ameaçando milhares de estudantes de Pós-Graduação com a retirada de suas bolsas de estudo.
Há, além da questão cultural, a do descaso do governo.


O Brasil investe em ciência e tecnologia apenas 1,2% do PIB enquanto os Estados Unidos, por exemplo, investem 2,7%, e vejam o tamanho do PIB dos EUA. Estes 2,7% deles talvez superem mesmo 10% de investimento nosso se olharmos para a proporção.

E sim, podemos ter 220 mil novos professores, mas teremos 220 mil novos e BONS professores? Qualificados, comprometidos, com dissertações e teses realmente válidas e úteis?

E aqui entramos em outro problema crucial da academia, a noção de "publicar ou perecer", algo que também é imposto pelo governo, através de suas "avaliações de produtividade" em que forçam o acadêmico a ter produção constante. quantidade ao invés de qualidade. Mais valem 10 trabalhos inúteis num ano do que 1 útil neste mesmo período.

Milton Santos disse uma vez que "essa ideia de que a universidade é uma instituição como qualquer outra, o que inclui até mesmo a sua associação com o mercado, dificulta muito esse exercício de pensar". Perfeito. O governo, assim como muitos donos de universidades acreditam que educação é mercadoria, é produção. E isto chega até mesmo às universidades públicas.

Troca-se a noção de qualidade pela de quantidade. Não importa se formaremos 10 bons professores, melhor formar 50 meia-boca pra ter quantidade e se sair bem nas avaliações governamentais, que privilegiam apenas a noção de quantos e não de como.

E enxerga-se, enfim, o círculo vicioso de um governo (todos os governos) que não se importa o suficiente para investir em educaçãose criar mão de obra mais ou menos qualificada, impondo regras draconianas de escala de produção aos acadêmicos que sobreviveram - dentro da eterna e persistente lógica capitalista - sem dar nenhuma contra-partida válida.

Educação básica péssima, investimentos tímidos em formação de mão de obra e novamente educação péssima quando se trata de formação de novos professores, de renovação de quadros.

Um país que se preocupa tão pouco com educação realmente acredita ser o país do futuro?

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Aparentemente a decisão estapafúrdia da CAPES de revogar as bolsas de estudantes que trabalham foi revogada, mas ainda pairam muitas dúvidas sobre o futuro e se esta estupidez retornará, visto que agora querem revisar bolsa-a-bolsa, numa verdadeira caça às bruxas.
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