O primeiro-ministro grego, Giorgos Papandreou, venceu mais uma no seu
teatrinho grego perfeitamente encenado. Conseguiu sua esperada
aprovação no parlamento, que reafirmou mais uma vez sua confiança no
governante. Uma vitória para ele, para a União Européia e,
principalmente, para os bancos.
Há alguns dias Papandreou surpreendeu o mundo com o anúncio de que
iria realizar um referendo para que a população decidisse se a Grécia
iria aceitar os termos impostos pela UE para o salvamento (sic) do país.
Revolta de um lado, surpresa do outro, muita confusão... Mas, no fim,
uma farsa muito bem ensaiada. Papandreou é o Jânio Quadros que quase
deu certo.
Suas bravatas, ao contrário das do ex-presidente brasileiro, foram
engolidas. Não pelo povo, mas pelo parlamento, o que escancara que tipo
de democracia a Europa adotou para resolver seus problemas.
Primeiro ato
Sua tentativa-farsa de um referendo para que a população decidisse o
futuro da Grécia, o pagamento das dívidas feitas e a aceitação de novos
"pacotes" financeiros lembrava em muito os referendos feitos na Islândia
em que a população soberanamente decidiu que não iria aceitar pagar
pelas dívidas contraídas por seus bancos.
Os islandeses se recusaram a permitir que o governo pagasse, com
dinheiro do povo, o rombo que seus bancos causaram. Os bancos eram os
responsáveis e não cabia à população pagar pelos prejuízos que
especialmente o Reino Unido e a Irlanda tiveram. E as "terríveis
conseqüências" anunciadas por estes e outros países, até o momento, não
se concretizaram.
Hoje, a Islândia está em franca expansão, com uma constituição
escrita colaborativamente pela população e experimentando os benefícios
da democracia participativa, e não a "democracia" dos bancos e das
organizações financeiras internacionais.
Uma derrota doída para o mercado que, obviamente, não podia permitir uma repetição que se tornasse a regra.
No caso grego, nem a própria população acreditou em seu primeiro-ministro. E estava certa.
As primeiras reações de incredulidade deram lugar à revolta: por que o
referendo não ocorreu meses antes, no início da crise, antes de todos
os cortes, de todos os sacrifícios?
Não é tarde demais? Sacrifícios, claro, sentidos apenas pela população e com o objetivo de salvar bancos da falência.
É o fim do primeiro ato, onde o primeiro-ministro fingiu tentar enganar a Europa para salvar seu povo.
Agora começa a tragédia.
Segundo ato
A população duvidou e estava correta. Logo a Europa começou a
reclamar, manipulados pelos verdadeiros líderes da União Européia (os
bancos e o "mercado"), a tão famosa mão invisível que, no entanto, nunca
foi tão visível e facilmente reconhecível.
A encenação contou com o apoio de um indignado Sarkozy, de uma
sentida Merkel, em um show de atuação que faria os antigos gregos
sentirem orgulho, ou mais provavelmente nojo, do resultado.
Chegaremos ao ponto em que mesmo o Parthenon será vendido para o pagamento de dívidas nunca feitas pelo povo, mas em seu nome?
Antes de deixar a poeira baixar, o golpe. O parlamento grego finge
revolta e vota uma moção de confiança contra Papandreou, ameaçando
tirá-lo do cargo por ter, subitamente e sem consulta, decidido ouvir o
povo.
É o momento em que o futuro de Papandreou e da Grécia poderia ser
definido, assim como a convocação de novas eleições, o que, em tese,
seria a oportunidade de a população grega demonstrar sua insatisfação
com os rumos do país. Na impossibilidade de um referendo, ao menos uma
eleição com praticamente o mesmo caráter decisivo.
Com tudo ensaiado e todos os atores em seus lugares, o show continuou.
Terceiro ato
Nunca saberemos que acordos foram feitos, e como foram feitos, entre
Papandreou, o seu partido PASOK e a "oposição de direita", mas
conhecemos bem o resultado.
Contra todas as expectativas que nos vendia a mídia internacional,
sempre aliada do poder, Papandreou recebeu a esperada confiança do
parlamento e, renovado momentaneamente, demonstrou sua força ao ponto de
anunciar que a idéia do referendo será descartada, de quebra,
anunciando que tentará formar um "governo de coalizão", ou seja, tentará
aproveitar o clima para juntar todas as forças dispostas a prostituir a
Grécia em troca de migalhas.
Mas a confiança recebida pelo parlamento grego foi apenas suficiente
para que um novo personagem surgisse, um novo primeiro-ministro a ser
apontado em conjunto pela recém-nascida coalizão ampla no parlamento,
uma coalizão que não interessa ao povo grego.
Uma peça perfeitamente encenada, com doses de surpresa, suspense e,
claro, um final feliz (ao menos para alguns) em que o romance ficou a
cargo do namoro entre políticos interesseiros e a Grécia, com seus
"parceiros" europeus prontos a dilapidá-la em troca da sobrevivência da
elite local.
Mais "ajustes", mais cortes e nenhuma eleição, nenhum referendo,
apenas a aceitação das regras draconianas impostas. Quanto mais
democracia, mais ameaçado se sente o mercado, por isso a democracia
precisa de limites, e assim o sistema continua funcionando... Para uns,
para poucos.
Ato Final
Papandreou tentou se salvar, mas caiu. Saiu por cima, tendo
conseguido a tão sonhada coalizão para submeter a Grécia definitivamente
ao mando dos bancos europeus. Seu sucessor, Lucas Papademos, é
ex-vice-presidente do Banco Central Europeu, o que diz muito por si só.
Uma nova eleição será convocada, mas apenas em meados de janeiro ou
fevereiro, após todos os “pacotes de ajustes” serem aprovados e enfiados
goela abaixo do povo grego.
Os políticos venceram; os gregos foram derrotados.
Artigo publicado originalmente no Correio da Cidadania
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segunda-feira, 21 de novembro de 2011
Crise grega: Papandreou é o Jânio Quadros que deu certo?
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Crise grega: Papandreou é o Jânio Quadros que deu certo?
2011-11-21T10:30:00-02:00
Raphael Tsavkko Garcia
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