sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Carta Aberta a Dilma Rousseff sobre mudanças no Ministério da Cultura

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Temos esperança que o Ministério da Cultura (MinC) continuará sua liderança em políticas de inclusão cultural para o século 21. O Brasil tem sido pioneiro nesta matéria, nos permita mencionar apenas alguns dos elementos que contribuíram para atrair a atenção do mundo para as políticas culturais do seu país. 
* O diálogo aberto entre o governo e a sociedade, formando uma visão de democracia que partilhamos;

* Os Pontos de Cultura, o Fórum da Cultura Digital, o Fórum de Mídia Livre e outros projetos que demonstram novas e inovadoras redes culturais adaptadas ao século 21;

* O apoio e desenvolvimento de software livre e sua adoção em instituições públicas que finalmente tem estimulado uma nova abordagem para o gerenciamento de recursos compartilhados. A adoção de software livre no Brasil transcende a esfera cultural e tem uma enorme relevância, pois é uma das poucas iniciativas globais para promover os commons digitais como estratégia de governo;

* A adoção de modelos de licenciamento aberto - como o Creative Commons - por instituições governamentais e organizações culturais financiados por fundos públicos;

* A liderança do Brasil para incluir outros países e ajudar na implementação da Agenda do Desenvolvimento da WIPO/OMPI (World Intellectual Property Organization/Organização Mundial de Propriedade intelectual). Isso contribui para equilibrar o sistema de propriedade intelectual em conformidade com os diferentes níveis de desenvolvimento e novas formas de produção cultural, assegurando o acesso ao conhecimento;

* A promoção impulsionado pelo Brasil em um debate mais amplo sobre as exceções e limitações das pessoas com deficiência visual na OMPI, em conjunto com outros países e com a sociedade civil internacional;
 
* A abertura do Brasil aos novos paradigmas de produção e disseminação do conhecimento. Sua liderança foi crucial porque os paradigmas digitais abertos serão de grande influência na construção da cultura e dos negócios do século 21;    
* A construção do Marco Civil da Internet e a rejeição da ACTA (Acordo Comercial Anticontrafação, na sigla em inglês).
Mas o tema contemporâneo mais urgente no qual o Brasil é pioneiro é, no entanto, a reforma da lei de direitos autorais, que visa ajudar os criadores e artistas a expressar sua criatividade e distribuir em um ambiente legal menos restritivo, para garantir que a sociedade goze de um equilíbrio de direitos no acesso ao conhecimento.

De acordo com a Lista de Vigilância da Consumers International, a lei de direitos autorais vigente no Brasil é uma das mais estritas do mundo quando avaliada a partir das perspectivas de acesso ao conhecimento. A lei carece de muitas das exceções ao direito autoral que outros países tem previstas nos seus regulamentos e proíbe muitos dos comportamentos mais comuns do comércio (incluindo a exibição de filmes para fins acadêmicos, a cópia de livros que estão esgotados e fora de impressão, a mudança do formato dos conteúdos digitais, tais como a conversão de música do CD para MP3). A lei de direitos autorais do Brasil é mais restritiva, de fato, que os tratados internacionais. Por sua vez, o ECAD, a gestora coletiva do Brasil, carece de transparência e de uma auditoria pública eficaz, ao contrário do que acontece em muitos outros países do mundo. Acreditamos que as mudanças propostas na lei de direitos autorais irá beneficiar tanto os autores como os cidadãos.

A discussão pública promovida pelo Brasil - o debate público em todo o país, complementado por uma consulta formal pública realizada pelo governo na Internet - pode servir como um exemplo de democracia. Mas isto estará garantido apenas se os resultados da consulta forem verdadeiramente levados em consideração, como prometido no início do processo. Isso é o que os cidadãos legitimamente esperam dos governos democráticos.

Estamos de acordo com os nossos colegas do Brasil, onde os resultados de um processo aberto e democrático não podem ser negligenciados pela opinião de juristas ou de qualquer "comissão de notáveis".

Como numerosos acadêmicos, advogados, organizações sem fins lucrativos e da sociedade civil, artistas e outros, disseram em sua carta aberta à presidenta Rousseff e à ministra da Cultura Ana Buarque de Holanda em 28 de dezembro de 2010:
"Se tem progredido muito nos últimos anos. E falta muito para fazer.Uma mudança na direção do Ministério da Cultura significa perder todo o trabalho realizado, assim como perder uma oportunidade histórica do Brasil para liderar, como vem fazendo, essa discussão em nível global, mostrando soluções e alternativas inovadoras e racionais, sem medo de tomar novos caminhos,sem ficar preso em modelos promovido pela indústria cultural dos Estados Unidos ou da Europa."
É importante destacar que existe uma narrativa subjacente a todos esses novos caminhos que o Brasil tomou como políticas públicas de cultura: estão inspiradas no reconhecimento pioneiro e aberto de que a cultura se faz em toda parte e por todas as pessoas, e que a cultura e a educação são direitos constitucionais básicos.

O tesouro mais importante do Brasil é sua enorme diversidade cultural. Um contingente de milhões de novos criadores é parte do tecido cultural do Brasil. Isso é o que chamamos de emancipação.

Durante anos, em incontáveis ensaios, análises e artigos de blogs, temos assinalado o Brasil como um líder internacional, como um exemplo de país comprometido em apoiar o acesso ao conhecimento e expandir sua cultura democrática. A adoção pelo Ministério da Cultura das licenças Creative Commons em 2003 foi realmente um dos maiores e mais admirados exemplos de tal liderança.

Nós,como parte da comunidade internacional, estamos preocupados com as recentes e significativas mudanças na política cultural no Brasil, que se nota em uma variedade de decisões, entre as quais a retirada da licença Creative Commons do site do MinC. Ainda assim, temos esperanças de que o processo para garantir, por lei, o acesso ao conhecimento está garantido e que o diálogo para manter uma Internet aberta, uma cultura digital aberta e colaborativa, a expansão dos recursos educacionais abertos e s reforma da lei de direitos do autor (Copyright)continuarão durante sua administração.

Enviamos esta carta aberta para pedir à presidenta Dilma Rousseff que assegure que as políticas progressistas no campo cultural no Brasil terão continuidade e serão ampliadas, para que a sociedade civil brasileira seja escutada e que o Brasil continue a ser um exemplo para o resto do mundo!

Mantemos a profunda esperança de que podemos continuar a falar da política cultural do Brasil como a mais progressistas do mundo!
Assinado, Commons Strategies Group
Fundación Vía Libre
e outros

Versão do texto em inglês e espanhol.
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