Recentemente, o ditador Abdullah da Arábia Saudita (que para a mídia tradicional permanece como um democrático e correto rei) concedeu de forma absolutamente benevolente o direito de votar e ser votada para as mulheres de seu país.
O tratamento dado a Abdullah combina com a simpatia demonstrada pela
mídia ao ditador – ou “presidente” – do Iêmen, Ali Saleh, que ainda não
caiu em desgraça com os EUA, o parâmetro para simpatias ou antipatias
midiáticas. Tratamento que diverge do dado a Bashar al Assad e Kadafi,
que rapidamente viraram ditadores sanguinários.
Palmas e comemorações de parte da imprensa, elogios vindos de aliados
e, claro, efusivas congratulações por parte dos EUA, que insistem em
levar democracia aos inimigos, mas nunca aos amigos.
Há, de fato, alguma diferença no tratamento dado pela Arábia Saudita
às mulheres? Mudou ou mudará alguma coisa em... 2015, quando chegarem as
eleições? Aliás, que eleições?
O país é uma ditadura onde quem
manda é o "Rei", simples assim. As eleições municipais ocorrem logo
mais, mas claro que esta benevolência real não valerá agora, antes o
povo precisa "se acostumar" com a novidade. Leia-se: é preciso arrefecer
o entusiasmo e mascarar a ineficiência ou impossibilidade de se aplicar
a decisão de forma ampla.
Além de se apresentar nas eleições
municipais (cujos membros são metade eleitos e metade indicados, mas no
fim não têm quase poder algum), as mulheres também poderão fazer parte
da Shura, algo como o parlamento nacional. Mas este nem chega perto de
voto popular, é totalmente nomeado pelo "rei". Ou seja, só entra mulher
se o rei quiser! Tem que ser amiga do rei, da mulher do rei...
Será interessante, em um país controlado por leis ditadas por mulás
que não permitem às mulheres sequer dirigir (que o diga serem
consideradas cidadãos completas), mulheres governando, mesmo que de
forma apenas aparente, sem poderes efetivos.
Parece um contra-senso. Vê-se o quão cosmética é a permissão
benevolente rei Abdullah. As mulheres podem concorrer, mas concorrer
para o quê? E para quê?
A questão ainda vai além. O rei não é
estúpido, não se mantém no poder há décadas sem ter um mínimo de
inteligência (petróleo, riquezas e bons amigos ianques ajudam, claro). A
idéia é dar às mulheres um falso poder. Dar a elas algo que, no fim,
não faz nenhuma diferença fora do papel.
Oras, as mulheres agora
podem votar ou ser votadas para conselhos que nada representam ou que
nem sequer são formados com o voto popular. E mesmo assim ainda precisam
de permissão dos maridos para sair de casa e votar. Precisam de
permissão dos maridos para se candidatar!
Se as mulheres não
podem sequer sair de casa desacompanhadas, como e por que raios irão
concorrer a algum cargo político ou mesmo votar? Só com permissão dos
maridos (ou pais, irmãos, algum homem "responsável"). Algo que para a
franca maioria será o mesmo que nada. Continuarão enclausuradas e nulas
(no sentido de anuladas, ok?).
Na Arábia Saudita - país dos mais
antidemocráticos e ditatoriais do mundo, mas bom amigo dos EUA - as
mulheres têm a mesma relevância que uma coca-cola: existem apenas para
dar prazer, serem consumidas enquanto tiverem algum gás e não podem sair
do lugar sozinhas.
Sim, a comparação é péssima, mas acho que me
fiz entender. Mas bem, como alguém espera que mulheres se candidatem e
sejam eleitas se não podem sair de casa? Se não podem dirigir um carro,
se não têm direito a NADA enquanto seres humanos?
Imaginem se,
por algum milagre, o rei indica uma mulher para a Shura. Esta irá
legislar sobre seu marido, sobre outros homens, mas até para ir ao
parlamento precisará de permissão destes mesmos homens. Para
simplesmente sair de casa e realizar o percurso! Se a mulher não morar
em Riad, a capital, precisará de permissão para viajar!
Abdullah
deu às mulheres um direito que estas dificilmente poderão usufruir, mas
ainda assim conseguiu enganar metade do mundo (ao menos a metade que
sente prazer em ser enganada).
Comemorar esta "vitória" é o mesmo
que comemorar a "vitória" dos valorosos rebeldes líbios, ou seja,
hipocrisia. Uma “vitória” em que o lado vencedor não terá condições de
usufruir do prêmio, dado que precisa de autorização dos homens para
fazê-lo e carece até de um sistema político capaz de possibilitar que o
esforço seja válido, que qualquer mudança faça a diferença.
Publicado no Correio da Cidadania
Blog de comentários sobre política, relações internacionais, direitos humanos, nacionalismo basco e divagações em geral... Nome descaradamente baseado no The Angry Arab
sábado, 22 de outubro de 2011
Direitos das mulheres: Uma farsa para Saudita ver
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Direitos das mulheres: Uma farsa para Saudita ver
2011-10-22T13:30:00-02:00
Raphael Tsavkko Garcia
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