quarta-feira, 21 de março de 2012

Roberto Laudísio: O uso criminoso das armas "não-letais" e a tortura legalizada

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Escrevi ha algum tempo, no auge dos protestos estudantes contra o aumento das passagens em São Paulo, sorbe o uso indiscriminado por parte da polícia de armas chamadas de "não-letais" que, na verdade, são verdadeiros instrumentos de tortura:
É válido um questionamento sobre o uso indiscriminado e descontrolado de armas ditas "não-letais" pelas forças de "segurança".

Balas de borracha, bombas de gas lacrimogêneo eufemísticamente chamadas de "bombas de efeito moral", sprays de pimenta concentrada e mesmo armas de choque são armas potencialmente letais, usadas de forma indiscriminada por policiais sem qualquer tipo de treinamento, e pior, com vontade de causar o máximo de dano que puderem.

Caso matem a vítima com estas armas "não-letais", poderão dar a desculpa de que foi sem querer ou de que cumpriam ordens.

Estas armas são basicamente instrumentos de tortura em massa com selo de aprovação governamental.
Mantenho o que disse a aproximo à realidade com um exemplo atual e polêmico.

O brasileiro Roberto Laudísio foi assassinado na Austrália pela polícia local com choques de taser (arma de choque) por, supsotamente, ter roubado um pacote de bolachas de um mercado.

Assim como com Jean Charles, que de tão absurdo o caso, virou um filme, o caso demonstra a forma pela qual seres humanos são tratados pelas forças policiais: Sem nenhum respeito pela integridade física e pela vida.

Jean Charles foi baleado covardemente e assassinado de forma brutal ao ser confundido com um suposto terrorista que, MESMO que fosse terrorista, não poderia ser assassinado a sangue frio sem sequer reagir. Não me consta que a legislação de nenhum país dito democrático permita o assassinato sem julgamento (isto para os países que promovem a pena de morte) nemque a polícia mate sem que esteja em perigo ou se defendendo.

Mesmo assim NADA aconteceu com nenhum policial inglês envolvida, assim como o Brasil não se empenhou em fazer justiça. Uma vergonha de ambos os lados.
O suspeito fugiu da abordagem, ainda conforme a polícia. Os policiais o perseguiram e, durante um confronto, dispararam uma arma de choque elétrico e usaram spray de pimenta.
Uma testemunha da ação disse ao jornal australiano “Sydney Morning Herald” que, mesmo depois de caído no chão, ele tentou se livrar e foi atingido pelo menos mais três vezes com a arma de choque, do modelo Taser. A ação foi filmada por uma câmera de segurança de um café da rua e exibida na TV australiana
No caso em tela, de Roberto Laudísio, o rapaz foi simplesmente agredido com um taser e então morto. Há tentativas de "explicar", de que talvez ele estivesse drogado, bêbado, ou mesmo tivesse ingerido algo que pudesse "facilitar" a ação letal do taser, uma arma não letal.
Tudo indica que Roberto sequer estava envolvido no furto dos biscoitos. Mesmo que tivesse,  é absurdo que houvesse motivos para tanta violência contra uma pessoa desarmada, sòzinha diante de uma equipe policial.
O crime lembra o assassinato de Jean Charles, o brasileiro perseguido e morto pela polícia inglesa, que alega tê-lo confundido com um terrorista.

Em primeiro lugar, não existe esse papo de arma não-letal, como já ficou bem claro pelas centenas de casos de mortes em decorrência do uso deste tipo de arma pelo mundo (só nos EUA, são mais de 500 casos documentados). É possível dizer que são armas MENOS letais, mas matam da mesma forma que um porrete ou um fuzil.

Em segundo lugar, armas ditas não-letais tem como característica a intenção de causar sérios ferimentos, ferimentos dolorosos e algumas vezes passíveis de causar cegueira, amputação de partes do corpo ou de causar paralisia permanente. Ou seja, é o Estado assumindo que não pdoe matar (ou talvez só algumas vezes, sem querer), mas pode ferir, mutilar, desfigurar...

Vejam que mesmo a tortura "clássica", como por exemplo a praticada pelos bandidos de farda durante a Ditadura - e que continua acontecendo em quartéis e delegacias contra pobres, negros e necessitados - não tem, em si, intenção de matar, mas tão somente de causar dor e sofrimento. Por vezes a tortura busca mutilar, amputar partes do corpo, causar danos permanentes, paralisia... Mas a morte costuma ser apenas uma decorrência infeliz, o prazer do torturador está não só no ato, mas também no resultado final, na certeza das sequelas inflingidas, na certeza do dano físico e psicológico à vítima.

Será que é possível notar semelhanças entre o sadismo do uso sistemático da tortura legalizada via armas "não-letais" e da tortura "clássica" que, sejamso honestos, o Estado considera ilegal mas faz vista grossa ou até incentiva sorrateiramente em muitos casos?

O caso de Roberto Laudísio mostra que o problema não é apenas brasileiro, mas mundial. A tortura é uma prática comum e que vai sendo legalizada e feita às claras - e contando com apoio de muita gente, de "especialistas"... -e tornada lugar-comum.

E muitos não vêem problema algum nisso. Tem coisa mais comum que protestos sejam "dispersados" com extrema violência e com largo uso de armas "não-letais"?

Podem dizer "oras, melhor um taser, uma balinha de borracha que sem querer pode causar um dano do que uma bala de verdade para dispersar um protesto". Bem, eu prefiro que manifestações sejam respeitadas e não dispersadas com violência, que ladrões em fuga sejam perseguidos e presos e não torturados, e que haja respeito ao inocente ou mesmo ao criminoso em fuga e que nenhum deles seja torturado, legal ou ilegalmente.

Aliás, é interessante notar como há uma separação entre a violência excessiva e o uso de armas "não-letais".

Balas de borracha, por exemplo, são considerados instrumentos comuns e inofensivos na dispersão de multidões - mesmo pacíficas. Não háestranhamento. Violência parece ser apenas quando há o uso do cacetete.

Prefiro que haja liberdade para protestar, liberdade para contestar sem receber uma bala de borracha "não-letal" na cabeça ou na coluna. Prefiro que um (supsoto) ladrão de bolachas escape com o pacote do que seja assassinado no meio da rua como um animal sem maior importância.

Pessoalmente eu não me importo se Roberto Laudísio é culpado ou inocente do terrível crime de robar um pacote de bolachas, o que me importa é que ele foi assassinado e não há nenhuma preocupação em se averiguar o principal: o uso indiscriminado da tortura como arma. A preocupação geral é com "porquês" aleatórios.

Oras, se descobrirem que ele estava bêbado ou drogado, a cupa do polícial e do Estado (australiano, no caso) diminui? Então todos os bêbados e drogados irão morrer - e dane-se - caso sejam vítimas do taser?

É triste que pessoas possam "legalmente" ser mortas, desfiguradas, deformadas, violentadas, desumanizadas... Enfim, torturadas.
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