segunda-feira, 19 de março de 2012

Dinamitando pontes: A militância LGBT governista e a homofobia oficial [Update]

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Não costumo, já há algum tempo, postar textos de terceiros no blog, mas acredito que este, do Francisco Aragão (vulgo @chcapet, @litheroy ou @elcapeto) em resposta ao texto lamentável da ativista LGBT Vange Leonel, merece ser repassado.

O texto da Vange, em resumo, desculpa o governo de todos os recuso nos direitos LGBT, praticamente culpando o oprimido pela opressão. O governo faz o possível, os LGBT tem que aceitar negociar com quem os odeia... É isso que entendemos do texto da ativista. Aqueles insatisfeitos devem engolir o "orgulho" e aceitar o que vier, tudo em nome de um proejto falido de poder.

Tentativa pura de tentar justificar o injustificável, um govenro homofóbico que não faz absolutamente nada para frear a violência homofóbica e a homofobia de pastores neopentecostas e bandidos semelhantes.

Os Marginais da Fé controlam o governo, e ainda assim Vange defende que não se dinamite pontes, oras, as pontes já foram dinamitadas, e pelo próprio governo. Acho que é hora do movimento LGBT (mas não só) parar de se preocupar com pontes e, acima de tudo, parar de servir de massa de manobra em momentos de desespero (quando o governo é atacado por seus alidos conservadores logo corre para pedir ajuda da esquerda traída). É hora de esquecer as pontes caídas, derrubadas pelo PT e dinamitar o governo.

Contemporizar levou ao abandono do Kit Anti-Homofobia (kit gay para os detratores) que não foi "temporariamente suspenso", mas jogado no lixo, abandonado; O próprio Ministro da Educação, o Mercadante, já disse não acreditar que educação resolva nada e que não há plano nenhum a ser feito.

Contemporizar levou ao crescimento de popularidade de escória como Bolsonaro, levou a membro do PT apoiar "Dia do Orgulho Hétero" no Rio (projeto de outro Bolsonaro, aliado do governo local do PMDB/PT, diga-se de passagem), e a tantas outras barbaridades.

Como diz o Chico, não se sabe de grupo negro ou judeu que tenha discutido leis para sua proteção ou para evitar o esquecimento de seu sofrimento com a KKK ou com Nazista, então como aceitar que se dsicuta direitos e cidadania com grupos de Marginais da Fé que, se pudessem, queimariam gays em praça pública?

Esse tipo de militância covarde, que troca a causa pelo partido é simplesmente inaceitável e apenas contribui para que NADA seja feito pelo governo na proteção e garantia dos direitos das minorias.
Lamentável a cegueira e aparente desinformação da colunista, perceptível desde o segundo parágrafo do artigo, quando erroneamente informa que o Escola Sem Homofobia foi “temporariamente engavetado” pelo Governo Dilma, isso quando sabemos que não apenas o ex-ministro Haddad já disse que CONCORDAVA COM A BANCADA EVANGÉLICA em suas objeções ao Kit (seja por convicção ou por conveniência política) e que o atual ministro Mercadante já deixou claro que considera que “material didático não combate homofobia”[sic].

Desnecessário fazer maiores comentários sobre as “concessões aos conservadores” no sentido de aprovar uma lei “com avanços possíveis” contra a homofobia. Fico imaginando se os judeus e negros, ao lutarem por leis anti-racismo, tentaram a tática da negociação com grupos hostis à sua causa, como a Ku Klux Klan ou os neonazistas.

Qualquer um que tenha se dedicado a estudar minimamente as crendices dos fanáticos da bancada evangélica sabe que eles estão dispostos a conceder aos LGBTs apenas o tratamento prescrito por sua interpretação fundamentalista da Bíblia: a “conversão” ou punição, podendo ser esta no Além-Vida “HOMOSSEXUAIS VÃO ARDER NO INFERNO” ou no Aquém, mesmo, através do impedimento do exercício da cidadania plena por esses grupos ou, mais idealmente, através do sancionamento da pena prescrita em seus livros sagrados (de acordo com Levítico, apedrejamento). Para quem duvida, basta lembrar que recentemente o deputado-pastor Marco Feliciano foi à tribuna da Câmara criticar o Reino Unido por praticar sanções contra a ungida nação de Uganda para defender a “ditadura gay”. Uganda, caso a colunista não saiba, é palco da disputa de defensores dos direitos humanos e de fundamentalistas evangélicos, onde há um movimento (apoiado pelos colegas de fé do referido deputado naquele país) pela aprovação de leis prevendo punições para a homossexualidade tais como a morte ou o impedimento de que homossexuais recebam tratamento contra o HIV.

Quanto a falar nas “boas intenções da ministra Maria do Rosário” a minha primeira reação foi de riso, principalmente considerando que o último ato notório da querida ministra foi tentar censurar o relatório sobre as violações dos Direitos Humanos na Terra do Meio, Pará, liderado pelo jornalista Leonardo Sakamoto, apenas porque esse trabalho mencionou as inúmeras violações desses direitos provocadas nessa região pela obra de Belo Monte, menina dos olhos do Governo Dilma.

Essas “boas intenções” da ministra se tornam ainda mais questionáveis quando se sabe que a dita-cuja já deixou bem claro que considera que a discussão de direitos civis dos LGBTs como a união civil e o casamento “cabe exclusivamente ao Judiciário”, postura COVARDE de uma representante do poder Executivo que se torna ainda mais vil diante do exemplo no sentido contrário que tivemos na nossa vizinha Argentina, onde a presidenta Cristina Kirchner se empenhou PESSOALMENTE pela aprovação do Casamento Igualitário.

Agora, a parte mais lamentável de todo esse artigo, em que pese a aparente desinformação em que ele foi escrito, é o esforço da colunista em responsabilizar a MILITÂNCIA LGBT DE FATO (a não comprometida por interesses pessoais e/ou partidários em sua necessidade de defender o governo) por uma suposta radicalização do movimento e pela “destruição de pontes”, além de “copiar a prática dos fundamentalistas”.

Quem dera, Vange Leonel, o movimento LGBT estivesse em condições de copiar práticas dos fundamentalistas. Práticas como a de cooptar fiéis em igrejas e colocá-los em ônibus (pagos com o próprio dinheiro desses fiéis, via dízimo) para levá-los à ALERJ e lotar as galerias para fazer pressão contra uma PEC que incluiria “orientação sexual” como uma forma de preconceito proibida na Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Práticas como eleger uma bancada que em troca de seus votos exige (E CONSEGUE) que uma chefe de Estado condene combate à homofobia como PROPAGANDA DE OPÇÃO SEXUAL e se mantenha absolutamente omissa em meio a uma escalada de crimes de ódio contra homossexuais sem igual nas Américas no último ano. Práticas como obter ministério para essa bancada ao mesmo tempo em que seus deputados chamam uma ministra de “aborteira” e “sodoministra”. Quem dera, Vange Leonel, a militância LGBT tivesse o poder para exercer práticas como as usadas pelos fundamentalistas.

Não porque a militância LGBT fosse se rebaixar à mesquinha busca por poder e controle da sociedade que é o objetivo declarado dos fundamentalistas, Vange Leonel, porque a nossa luta nunca foi essa. A única coisa que nós pedimos são direitos iguais e sermos tratados como cidadãos, Vange Leonel. E vem sendo isso que o governo que você defende como portador de “boas intenções”, Vange Leonel, nos nega sistematicamente.

Vange Leonel nos fala do seu temor pela “destruição de pontes”, ao que se pergunta: QUE PONTES, VANGE LEONEL? A colunista poderia citar uma liderança LGBT de alcance nacional que tenha sido recebida pela presidente Dilma no Planalto ou Alvorada até agora? Mostrar uma foto de Dilma Rousseff ao lado de Jean Wyllys, Toni Reis ou mesmo dela própria, Vange Leonel? Porque fotos de Dilma Rousseff ao lado de Marisa Lobo (a autointitulada “psicóloga cristã”) já vimos. Ao lado de Crivella, já vimos. Que Dilma Rousseff ligou por quinze minutos para Silas Malafaia implorando pelo apoio dele nas eleições de 2010 nós sabemos porque o próprio disse isso ao The New York Times em entrevista nunca desmentida pela Presidência, Vange Leonel. De modo que confesso minha curiosidade em saber onde está essa mítica ponte enxergada por Vange Leonel que não se encontra em lugar algum.

Vange Leonel tem medo de que “a militância parta para a luta feroz”. Pois eu digo que a militância tem a OBRIGAÇÃO de partir para a “luta feroz” contra grupos que se dedicam a incentivar o ódio, a intolerância e desumanização do Outro como meios de angariar mais poder sobre a sociedade, sob o olhar complacente, se não cúmplice, de um governo que vem se comportando da forma mais abjeta diante de uma militância que tanto fez em prol de sua eleição. De um governo traidor, em resumo. E essa obrigação não é apenas devida aos LGBTs, mas ao país como um todo. Essa tática de escolher um grupo como bode expiatório para os males da sociedade já foi utilizada outras vezes na História e todos sabem que em boa coisa isso nunca acaba. Primeiro os fanáticos evangélicos perseguem os LGBTs. Depois serão os ateus e praticantes de religiões afro-brasileiras. Quando pararem para olhar, já vão estar cuspindo na cara dos católicos. Quem chutou uma imagem de Aparecida outro dia mesmo?
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Update (21/03):

O Chico escreveu ainda outros dois bons posts que merecem ser lidos, em resposta à falta de resposta e diálogo da Vange e aos demais detratores que se recusam a dialogar e apenas atacam: 

“Pense, mas fique quieto”  
"Vange Leonel ou A Arte de Cobrar da Vítima o Que Deveria Ser Cobrado do Opressor"

E o @Fabjanski também escreveu um texto primoroso sobre a noção de radicalismo e diálogo: 

"(Impossibilidade de) diálogo e radicalismo"
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