segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Batismo de Sangue e Anistia: Quando iremos respeitar quem morreu por nós? #DesarquivandoBR

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"São noites de silêncio
Vozes que clamam num espaço infinito
Um silêncio do homem e um silêncio de Deus."
Frei Tito
Assisti sábado, durante a mostra Cinema e Direitos Humanos da América Latina o filme "Batismo de Sangue", baseado em livro de Frei Betto e com atuação magistral de Caio Blat no papel de Frei Tito e direção de Helvécio Ratton.

O filme é excelente. Uma biografia de um dos períodos mais conturbados e violentos de nossa história, carregado de emoção, que mostra o assassinato de um dos grandes heróis do país, Carlos Marighella, e as torturas que sofreram alguns freis que combatiam ao seu lado e de um modo particular. Dentre os presos e torturados, Frei Betto, que escapou das torturas físicas nas mãos de Fleury por ser sobrinho de um General - mas não escapou da tortura psicológica, da prisão e de ver seus amigos e sonhos desmoronarem.

Mas o personagem principal do filme é, incontestavelmente, Frei Tito de Alencar Lima, ou só Frei Tito.

Nordestino, pobre, mas valente na luta e na resistência, foi quebrado aos poucos pelas torturas, pelo pau de arara, pela cadeira do dragão, pela humilhação e pela desesperança. Foi vítima da tortura física e psicológica e, por fim, não conseguiu continuar com sua vida, cercado pelos fantasmas da ditadura, se sentindo perseguido até que, por fim, se suicidou na França, ao não suportar mais sofrer e reviver seu passado de dor.

Não foi fraco, longe disso, sobreviveu às torturas, foi libertado da cadeia em uma troca de prisioneiros, mas não queria deixar seu país. Não morreu apenas devido aos fantasmas, mas devido à distância de sua pátria, da distância de seus amigos e companheiros. Não resistiu viver longe da terra pela qual derramou seu sangue e dedicou sua vida.

Frei Tito é um exemplo de luta, de resistência e de dedicação e merece ser sempre lembrado, assim como seus companheiros que tombaram na luta e os que, hoje, se mantém fiéis aos seus ideais, que não se venderam ou venderam sua luta apenas pelo poder, mas não pelo povo. Não podemos comparar a luta destes heróis com quem, hoje, é consultor de megainvestidores internacionais, com quem abandonou suas bandeiras e ideologia apenas para se manter no poder a qualquer custo.

Estes, que hoje são exemplos de tudo aquilo pelo qual Tito e outros lutaram CONTRA, sujam a história dos verdadeiros resistentes, que preferiram morrer a viver longe de sua pátria ou a vender sua ideologia ou que simplesmente morreram sob tortura ou executados por bandidos a mando do Estado.

E são estes, que traíram sua causa, seus companheiros e sua história que, hoje, estão no poder e se recusam a acatar a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que está completando DOIS ANOS de inadimplência sem que o governo demonstre a intenção de cumpri-la e nem a OEA de aplicar medidas punitivas.

A decisão trata da Guerrilha do Araguaia - da qual nenhum dos principais retratados pelo filme participou -, mas é emblemático. O fim da Lei da Anistia e o julgamento dos criminosos responsáveis pelo Araguaia abriria as portas para que os responsáveis pela tortura de Tito e tantos outros fossem igualmente ulgados e presos.

São pessoas que estão no poder, que TEM o poder para fazer cumprir as decisões da OEA, de usar seu poder e pressão política para facilitar a revogação da Lei da Anistia e de punir torturadores e colaboradores do regime ditatorial em respeito, honra e justiça à memória de seus ex-companheiros, mas que preferem fazer o contrário, não apenas calar sobre a decisão, mas se aliar carnalmente com os algozes do passado.

Nossa luta é por justiça e pela preservação da memória. Para que se conheça, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça.

Esta postagem faz parte da sexta Blogagem Coletiva #desarquivandoBR
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