quarta-feira, 28 de novembro de 2012

O Genocídio Guarani Kaiowá tem autores e causas conhecidas, mas nada se faz

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O que vem acontecendo com os Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul, acredito, já é de conhecimento público. É notório e motivo de revolta que há muito não se vê.

Não pretendo me alongar na descrição dos crimes cometidos contra esse povo - e outros povos, a semelhanaça é incrível -, crimes estes que não são recentes, mas datam de mais de 500 anos, desde que os primeiros portugueses descobriram que apenas espelhinhos e miçangas não conquistavam ou conuistariam os donos da terra e que seria "necessário" fazê-los sangrar, destruí-los, genocidá-los.

Milhares de índios confinados a territórios exíguos, cercados pelo deserto verde da agroindústria, vivendo na beira de estradas e rodovias e entregues à própria sorte, ou melhor, à falta de sorte e à infelicidade de serem vítimas não apenas de agricultores, mas também do Estado. E não apenas os Guarani Kaiowá enfrentam esta realidade ou este destino, infelizmente é mais comum do que pensamos.

Ha alguns dias alguns valentes resolveram resistir, voltaram às suas terras ancestrais em Pyelito Kue / Mbarakay, no município de Iguatemi, Mato Grosso do Sul, onde vivem desde antes do homem branco chegar e tomá-las à força. Ameaçam morrer em defesa de suas terras, não tem nada a perder e darão suas vidas pelo direito de ao menos serem reconhecidos.

Escreveram em uma emocionada e emocionante carta ao povo brasileiro - do qual fazem parte, por mais que sejam tratados como cidadãos de segunda ou sequer cidadãos:
A quem vamos denunciar as violências praticadas contra nossas vidas?? Para qual Justiça do Brasil?? Se a própria Justiça Federal está gerando e alimentando violências contra nós. (…)
De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs e avós, bisavôs e bisavós, ali estão o cemitérios de todos nossos antepassados. Cientes desse fato histórico, nós já vamos e queremos ser morto e enterrado junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui.
Não se trata de suicídio - pois de certa forma ficar longe de suas terras, de seus ancestrais, já significa morrer um pouco, perder sua identidade e sua história - mas sim de resistência.

Resistência valente, quase uma entrega.

E as razões são várias, mas assim como ao longo de toda sua história recente, pós "fundação'" do Brasil, sem que fossem consultados sobre os termos e seu destino, o culpado é o Estado.

Seja a culpa direta, por sua frouxidão na demarcação de terras ou mesmo pelo envio de tropas para afugentar e mesmo matá-los, como era comum durante a Ditadura Militar, - basta lembrar dos Waimiri Atroari - até pela culpa, digamos, indireta, que perpassa pela vista grossa ao assassinato sistemático de indígenas, invasão de suas terras e sua posterior exulsão ou a vista grossa às ações de aliados do governo em ações que promovem verdadeiros genocídios.

Este genocídio Guarani Kaiowá tem culpados com nomes conhecidos por todos e cujas ações ou falta de ação são diretamente responsáveis pelos crimes cometidos contra este povo, que vão desde o estupro, passando pela intimidação, ameaças, violência física de inúmros tipos e expulsão de terras até o assassinato e empurram os que não aguentam mais lutar à escolha final do suicídio, que não é "cultural" como algns detratores tentam afirmar para tornar "oomum" a situação.
São senadoras, deputados, presidentas, governadores, vereadores... Enfim, políticos que financiam e são financiados pela soja, pelo trigo, pela agroindústria que não respeita nem natureza nem gente.

São donos do poder que passam por cima não apenas de indígenas, mas promovem o genocídio da população negra, promovem a queima das favelas, promovem o verdadeiro apartheid social em que vivemos. São elites amigas, ligadas, que não podem ser dissociadas.

Trata-se de promotores dos desertos verdes, de empreiteiras, de agroindústria, de financiadores de campanha, de compradores de políticos e políticos vendidos pelo melhor preço e, no fim, trata-se do reflexo de uma sociedade doente, desunida, despolitizada e consumista onde impera o individualismo torpe frente à mínima visão de sociedade e coletivo.

O genocídio dos Guarani Kaiowá não é fato isolado, mas apenas reflexo da sociedade e das ellites brasileiras. É histórico, cotidiano e não atinge apenas indígenas, mas toda e qualquer população vulnerável, minorias e aqueles abandonados pelo Estado.

Artigo originalmente publicado na versão imprensa do Jornalismo B, edição 48, 1ª quinzena de novembro de 2012.
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