terça-feira, 30 de julho de 2013

A santa quebrada: Quando igualam o oprimido ao opressor

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Se algo me surpreendeu em relação à santa quebrada durante a Marcha das Vadias, sem dúvida foi a repercussão por algo tão estúpido. E digo estúpido em todos os sentidos possíveis: Desde ter chegado a este ponto de repercussão negativa até o ato em si, que foi estúpido e mesmo burro. Mas legítimo.

Antes de mais nada, é preciso deixar claro: Não é aceitável de forma alguma igualar o oprimido em ato de revolta a seu opressor. E a Igreja Católica é a opressora.

Da mesma forma, não se iguala ato de opressor contra outro, como se isto deslegitimasse o oprimido de protestar.  Falo aqui dos exemplos toscos ou comparações toscas entre o ato de um pastor evangélico (opressor) quebrar uma santa católica em uma guerra entre opressores.

Tampouco procede a comparação entre a opressão de evangélicos destruírem terreiros (opressor versus oprimido) e o caso em tela, pois ocorreu o INVERSO, ou seja, seria como se, revoltados com a opressão e a devastação de seus terreiros, pais (e mães) de santo fossem até "templos" evangélicos descarregar sua justa raiva contra o opressor.

Seria burro, afinal os evangélicos (e católicos) tem mídia, ao passo que os oprimidos não. Mas não deixaria de ser legítimo. E até porque este tipo de violência é desnecessário e contraproducente.

No caso em tela, das "vadias", exigir q o oprimido por séculos "respeite" o opressor porque "ain, liberdade religiosa" é o mesmo que dizer que o negro tem que "ficar no seu lugar"... Isso não quer dizer que não haja exageros e burrices, mas igualar oprimido com o opressor por sua raiva incontida (e justa) é se juntar ao opressor. É fazer o jogo exato do opressor e ajudar a ampliar a opressão.

E sim, a Igreja Católica é opressora, repito. Por séculos manteve as mulheres em posição subalterna. Oras, as queimava vivas! E mesmo hoje ainda patrocina políticas retrógradas, contrárias aos direitos humanos e das mulheres (e dos gays, e de outros grupos).

E seus dogmas não mudaram. Ela não deixou de queimar mulheres vivas por ser boazinha, mas porque tal ato deixou de ser aceito ou mesmo de ser legal. A Igreja não parou de pregar o racismo e a inferioridade de povos indígenas, novamente, pro ser boa, mas porque foi forçada.

É preciso ainda separar atitude individual e coletiva. Alguém quebrar uma santa na Marcha das Vadias é burro se pensarmos em movimento. Mas é justo, justificável individualmente, enquanto ato individual de um oprimido. E, novamente, é bom lembrar que a falsa oposição "a maioria dos católicos não pensa como a igreja" não procede, visto que a Igreja não é uma democracia, senão uma teocracia. Só importa a opinião do Papa e de seus subordinados (Bispos, Cardeais e etc e olhe lá!), ou seja, para a Igreja, se você não segue seus dogmas você é que está errado.

Por mais que eu seja simpático a grupos como as Católicas pelo Direito de Decidir, sou forçado a admitir que elas é que estão erradas, pois acreditam que a Igreja seja passível de mudança pela base.

Não é.

E as Comunidades Eclesiais de Base ou mesmo a Teologia da Libertação estão aí para provar.

A cresça individual do fiel não importa para a Igreja. Se você "gosta" de gays e até acha que eles podem casar, ou que as mulheres tem direito a abortar, bom pra você, bom pra nós, mas para a Igreja você está errada. 

Da mesma forma, não me lembro de tanta revolta pelo gasto de milhões de dinheiro público em um evento religioso, que afronta a constituição brasileira, com direito a distribuição de livrinhos que pregam a homofobia e diminuem a mulher. Contra isso nem um "ai", mas quebrar a pobre santa?

E, vale lembrar, o ato de quebrar a santa não é um ato contra o fiel, não é uma ofensa dirigida a um ou outro indivíduo, é um ato político contra a Igreja, contra a estrutura. E exigir do oprimido respeito à Igreja é pedir à estuprada par respeitar o estuprador.

Algo que me veio a mente também é a hipocrisia de muitos em se revoltar contra a santa quebrada, mas achar lindo que Maomé tenha sido caricaturado. riram inclusive da revolta causada em países como o Paquistão. Oras, eles são muçulmanos, atrasados, presos ao passado...

Mas não é a mesma coisa? Trata-se de símbolos e dogmas que foram dessacralizados, mesmo quebrados. Mas porque com os muçulmanos é engraçado e com os católicos não é?

Por fim, é óbvio que o ato de quebrar a santa, or mais teatral e político que seja, e mesmo legítimo, foi burro. Foi e é contraproducente para o movimento. Mas só.

Não foi "errado", não foi "anti-ético" e muito menos "criminoso". Mulheres oprimidas não podem ser jamais igualadas a seu opressor. E muito menos a religião e seus símbolos são intocáveis, imexíveis ou sagrados para a sociedade. O são para uma parcela, mas isto não significa que não possam ser tocados.


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