Dilma ligando para Lugo: "Tá vendo? Eu disse que não bastava se aliar com a direita, é preciso governar para a direita".
Esse diálogo, obviamente hipotético, não me parece distante da
realidade, das possibilidades. Dilma e Lugo se sustentam sob uma base de
centro-direita. Lugo se sustentava em base composta pelo Partido
Liberal e por setores do Partido Colorado. Dilma ainda tem o PT e mais
um ou outro partido que se declara de esquerda - por mais que não sejam -
em sua base, mas ainda assim é dominada pela direita. Ou melhor,
deixou-se dominar através de alianças com a direita, desde a liberal até
a abertamente fascista. De PMDB a PP, com passagem pelos evangélicos do
PSC e os pastores do PR. Lugo, por outro lado, não tinha nenhum
parlamentar de seu partido/coalizão eleito, dependia inteiramente do
partido de seu vice e algoz, Frederico Franco, cujo sobrenome é de
causar calafrios.
E Dilma, assim como Lula, logo aprendeu que para se manter no poder o
caminho mais fácil era fingir que colocava em prática bandeiras dos
movimentos sociais e que transformava a sociedade através de imensa
propaganda, com uma militância fanatizada e cega, e programas e projetos
que, na verdade, tinham e têm o objetivo apenas de criar um mercado
consumidor mais amplo.
Educação? “Coloquem os pobres em ‘UniEsquinas’ que lá não terão
educação de verdade - mas pensarão que têm - e garantimos os lucros
imensos aos empresários do setor. Vamos dizer que todo o país é de
classe média, uma bela jogada de propaganda, mesmo que sob renda per
capita de 291 reais por família” - o que é situação de miséria em
qualquer outro país sério.
Com juros mais baixos, o que em si é bom, conseguem fazer com que a
população consuma mais e se endivide mais, passando a idéia de que os
bancos não lucrarão muito com isso. “Vamos elevar a renda dos mais
pobres, não para que tenham dignidade, mas para, com 291 reais ou um
pouco mais, poderem consumir e, claro, garantir o lucro dos
empresários”.
E por aí vai...
No fim das contas, bandeiras como a dos direitos reprodutivos da
mulher, luta contra homofobia, reforma agrária e outros assuntos
proibidos pelos aliados conservadores foram fácil e rapidamente
abandonadas por Dilma, pelo PT e pelos remanescentes de esquerda da
base. Salvo um ou outro, todos preferiram o fácil poder à dignidade e à
ética.
Mas a tática deu certo, o PT continua no poder. Repete que luta
contra a direita, representada quase que exclusivamente pelo PSDB (ainda
que o PT esteja aliado com o PSDB em várias cidades) e pelo DEM, cujos
membros, em grande maioria, migraram para o PSD, que agora apóia o PT e,
claro, recebe sua parte do bolo.
Lugo, por sua vez, parece realmente não ter escutado ou aprendido com
Dilma. Fez aliança com a direita, mas não aceitou integralmente seu
programa. Não aceitou criminalizar abertamente camponeses e os mais
pobres e não aceitou derramar o sangue dos membros dos movimentos
sociais. Lutou contra o pior que a direita podia fazer. Não que tenha
feito um governo de esquerda ou exatamente bom, mas ao menos conseguiu
frear boa parte do ódio que a elite tem pelos que não aceitam calados
sua situação de subserviência e pobreza.
O Paraguai não é o Brasil, não há dinheiro infinito para dar a
aliados sempre que reclamam. Por mais que o Brasil não seja um paraíso, o
Paraguai é um país ainda mais pobre, com uma miserabilidade muito maior
(em termos proporcionais), com uma sociedade civil mais desorganizada
que a nossa e com uma mídia ainda pior e claramente golpista. Lugo não
cedeu em tudo, como fez e faz Dilma e em menor grau Lula, e pagou o
preço.
Lugo caiu, mas decidiu não resistir. Fica como lição para certa
esquerda que aliança com a direita não é garantia de nada. Caso
contrarie os "aliados", o golpe pode chegar. Não se confia em fascista,
não se coloca a segurança de um país nas mãos de forças retrógradas e
conservadoras.
Para a América Latina fica também uma lição, a de que é preciso unir
os esforços para evitar a retomada da direita, seja pelas urnas, seja
por golpes. E a direita é mestra em dar golpes. Honduras primeiro, agora
o Paraguai. A direita está começando pelas periferias da América
Latina, pelos mais vulneráveis, mas pode se animar ainda mais.
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Artigo publicado originalmente em 27 de junho no Correio da Cidadania, mas ainda extremamente atual.
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sábado, 11 de agosto de 2012
Brasil e Paraguai: a diferença é a capacidade de se vender
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Brasil e Paraguai: a diferença é a capacidade de se vender
2012-08-11T13:30:00-03:00
Raphael Tsavkko Garcia
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