quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Islamismo, o coadjuvante incômodo nos protesto egípcios

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Os EUA e seus aliados - notadamente os comumente estridentes, mas atualmente silenciosos Israelenses - vem tentando fazer com que a opinião pública mundial olhe para os protestos no Egito não como uma Revolução Democrática em curso, contra a tirania - patrocinada por este mesmo EUA e aliados -, mas como uma cópia da Revolução Islâmica iraniana.

Nada poderia ser mais falso.

É fato que não podemos prever o futuro, o que sairá deste processo incontestavelmente revolucionário (sequer sabemos se Mubarak cairá, por mais que a torcida seja grande, mesmo dentro dos EUA), mas os indícios nos apontam para algo bem diferente do que ocorreu em 79 - e sem tomada de embaixada americana.

Os egípcios que protestam tem em comum com os iranianos de 79 apenas o fato de estarem lutando contra a opressão e a tirania e que, em ambos os casos, estes regimes foram (E são) apoiados pelos EUA. A partir daí, as histórias divergem.

Não há líder ou grupo por trás dos protestos egípcios. A Irmandade Muçulmana, tão temida pelos EUA - ainda que sem grandes fundamentos, explicarei adiante -, aderiu aos protestos dias após seu início e se boa parte da organização das manifestações (ou ao menos o início das marchas) se dá das mesquitas, é porque os protestos começam após a reza do meio-dia (a população é, afinal, majoritariamente muçulmana, ainda que os protestos contem com amplo apoio dos Coptas cristãos) e porque as mesquitas são um excelente ponto de encontro em que as forças de segurança não invadem ou batem, servindo como ponto neutro, seguro.

Não podemos esquecer que Mubarak, presidente/ditador egípcio instou os pregadores das mesquitas a discursar contra as manifestações. Apenas para constar.

Acreditar que, por várias manifestações começarem nas mesquitas, a revolução é "islâmica", é o mesmo que dizer queos EUA são uma teocracia cristão, já que todo presidente dos EUA usa deus em basicamente todos os seus discursos, na pose, em comunicados e etc.

Voltando à Irmandade Muçulmana, vale explicar brevemente o porque deste grupo dificilmente apresentar um "perigo islâmico". Em primeiro lugar - e mais importante - a Irmandade parece com o PT: Fragmentado, cheio de tendências e, assim como o partido brasileiro, tende a adotar posições mais brandas para e quando (se) chegar ao poder. Não necessariamente por esta ser uma vontade da população, mas pela própria organização interna conflituosa e diversa.

Existe na Irmandade mesmo aqueles que preferiam que o grupo sequer se apresentasse como partido. A caridade, os debates filosóficos e religiosos e a irmandade em si deveriam bastar.

Os protestos no Egito, enfim, são autenticamente populares. Não são influenciados - ao menos não de forma visível - por qualquer grupo, partido ou Estado. Mesmo a tentativa de El Baradei de se colocar como liderança esbarrou na desconfiança de muitos egípcios, que vem se organizando coletivamente para, por exemplo, distribuir comida, cuidar de feridos e proteger museus, casas e outros locais de importância.

Alguns já falam na Comuna do Cairo. Talvez uma precipitação, mas o fato é que muitos estão se auto-organizando e fazendo as vezes de Estado.

O medo do Islamismo também não se justifica na Tunísia, onde mesmo o líder do partido islamita local já declarou não defender imposição da sharia, se declara centrista e disse ainda não estar pronto para participar de eleições. Como se vê, bem diferente do perigo e terror pintados pelos EUA e pela mídia ocidental - esta que merece post a parte, em especial a ridícula e vergonhosa mídia tupiniquim.

Voltemos ao Irã: De fato a Revolução (que logo se tornaria Islâmica) era apoiada por diversos setores, desde comunistas a radicais islâmicos. Mas no país havia uma liderança clara, o Aiatolá. Havia um direcionamento, lideranças a seguir. No Egito a coisa parece ser mais ou menos autônoma e os partidos são marginais, meros espectadores em busca de espaço. Sejam eles de esquerda, direita ou religiosos.

O islamismo é apenas o perigo que aponta o ocidente para deslegitimar o anseio popular por liberdade. Estamos falando de um aliado importante dos EUA e de Israel, e não qualquer país insignificante, mas um colosso, o maior país Árabe (em população), um grande receptor de investimentos dos EUA e país estratégico em termos geográficos e políticos.

Não é pouca coisa. E a propaganda estadunidense não poderia deixar de agir.

Mas, enfim, as semelhanças com a Revolução Iraniana existem, mas não justificam o temor de uma repetição, ainda que, se se repetisse e fosse pela vontade da população, pouco poderia ser feito, ou mesmo deveria ser feito além de respeitar a vontade soberana do povo egípcio.

E os EUA, infelizmente, tem o terrível costume de jamais respeitar decisões de qualquer povo se estas forem diferentes da sua vontade, vide a vitória do Hamas na Palestina.
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