Agora vamos
ao segundo ponto, continuando a parte 1 que pode ser lida aqui: A posição do Lula, da OAB e do dissidente.
Se me perguntarem diretamente se concordo com o
que ele disse, serei forçado a dizer que sim, em parte e não, em parte.
"Temos de
respeitar a determinação da Justiça e do governo cubanos de
deter as pessoas
em função da legislação de Cuba. A greve de fome não pode
ser utilizada como um pretexto
de direitos humanos para liberar as pessoas. Imagine se todos
os bandidos presos em São
Paulo entrarem em greve de fome e pedirem liberdade."
"Gostaria
que não ocorressem [detenções de presos políticos], mas não
posso questionar as razões pelas quais Cuba
os deteve, como tampouco quero que Cuba questione as razões pelas quais
há pessoas presas no Brasil"
"A comparação é despropositada, pois tenta banalizar um recurso extremo
que é, ao mesmo tempo, um símbolo de resistência a um regime autoritário
que não admite contestações"
"Mais razoável seria se o governo brasileiro se preocupasse com as
péssimas condições carcerárias a que [os presos de SP] estão submetidos"
Disse ainda o
dissidente Guillermo Fariñas:
"Com essa
declaração o que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
demonstra é seu comprometimento com a tirania dos Castro e seu desprezo
com os presos políticos e seus familiares. A maioria do povo cubano se
sente traída por um presidente que um dia foi um preso político"
De certa
forma, não tiro a razão nem das palavras do Lula e nem das palavras da
OAB. E considero ridículas as do Dissidente.
Como eu disse antes, a greve de fome,
ao meu ver, deve ter objetivos realistas. Se todo bandido fizer greve
de fome para ser libertado é melhor fechar as cadeias porque todos vão
começar... A comparação faz total sentido. Dentro da legislação cubana,
Zapata, que morreu depois de fazer greve de fome, é (era) um criminoso e
por isto estava na cadeia. Os dissidentes - e a direita midiática -
realmente acreditavam que Lula iria defendê-los em detrimento de Cuba?
Zapata e demais dissidentes são, para
Cuba, criminosos. Para suas organizações, são heróis. Fazem a greve de
fome acreditando que irão divulgar sua causa e sensibilizar a população e
o governo. Erram miseravelmente. Nem sensibilizam o povo e tampouco o
governo. Se isto é reflexo de suposta censura ou simplesmente sua causa
não interessa ao povo, não posso afirmar. Pessoalmente minhas simpatias
passam bem longe dos dissidentes financiados pelos ultradireitistas de
Miami.
De qualquer maneira, é fato que os dissidentes, no geral, tem um alcance limitado em Cuba, seja pelo controle midiático ou seja pelo rechaço do povo às suas idéias. Dificilmente, nesta situação, iriam sensibilizar o governo. Quem odeia Cuba já odeia, quem gosta, sabe perfeitamente onde está se metendo. Os dissidentes pouco fazem para mudar o quadro.
Indo além da comparação feita pelo Lula - a qual
não vejo qualquer problema, na verdade vejo muito sentido -, sua frase
seguinte é ainda mais inteligente. Lula e o Brasil não dão qualquer
apóio aos dissidentes, logo, qual seria o sentido de criticar o sistema
legal de um Estado amigo porque meia dúzia de insatisfeitos resolveram
protestar e um morreu no processo?
Quanto à frase da OAB, tendo a concordar que, de
fato, Lula errou ao dizer que a greve de fome não é um instrumento
válido. Sim, é mais que válido. Talvez não como pretexto para liberar
alguém, mas sim como pretexto de dar publicidade à uma luta, por mais
que deslocada, no caso específico. Não vi problemas com a comparação entre Cuba e seus presos e os presos daqui. Foi certeira.
Quanto à
alegação de que Cuba é um regime autoritário, bem, teremos de discutir o
que é exatamente ser autoritário. Será que é um regime com eleições -
mas de partido único - em que a metade do legislativo é formado por
independentes, que provê alimentos, moradia, saúde e educação para todos
os seus cidadãos e com meia dúzia de insatisfeitos e dissidentes ou um
regime chamado de democrático, com todas as letras, com um legislativo
multipartidário, mas com dezenas de siglas de aluguel, com criminosos,
corruptos e assassinos representando o povo, sem prover as mínimas
condições de saúde, educação, moradia e alimentação para a maior parte
da população?
Se quisermos usar como quesito para definir uma "democracia" a existência ou não de presos políticos então Espanha, Brasil, EUA e a maior parte das "democracias" deverão passar a ser chamadas de ditaduras. Só a Espanha tem mais de 800 presos políticos - majoritariamente Bascos - em suas cadeias e são dia após dia condenados pela ONU por suas práticas.
Cuba tem seus defeitos. O Brasil tem seus
defeitos. Se os dissidentes falam pelo povo, porque não vemos nenhuma
reação de peso da população? A declaração final do dissidente Fariñas é, enfim,
lamentável.
Curioso, aliás, notar que os dissidentes presos ou em
liberdades não passam das dezenas e, mesmo assim, o dissidente afirma
ser maioria. A causa, por vezes, cega. Pior ainda, porém, é a atitude da
Folha de São Paulo que se limitou a ouví-lo e não deu qualquer espaço
para os que dele discordam. O jornalismo esgoto de sempre.
Cuba possui problemas terríveis de liberdade de expressão, isto é fato, mas não vejo onde uma oposição financiada pelos EUA possa ajudar em nada na luta justa por liberdade. Por outro lado, não vejo ninguém dando chiliques e mandando o Brasil condenar a Espanha por fechar jornais (vide o caso Egunkaria e o caso Egin), ilegalizar partidos (Batasuna, ANV, Aukera Guztiak, EHAK....), prender, torturar e matar seus "dissidentes".... ou mesmo fraudar eleições!
Aliás, cabe terminar com a frase magistral do Censo Amorim na Falha de ontem:
"Tem muita gente que quer o
apoio do governo brasileiro.
Uma coisa é você defender, como nós defendemos, a democracia e os
direitos humanos,
outra coisa é você sair dando
apoio a tudo que é dissidente de
todo mundo, isso não é papel
[do Brasil]"