quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Opressão, repressão, violência, medo: É o que significa "Espanha" no País Basco [Atualização]

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[Atualização ao final da postagem]
Estava caminhando calmamente com minha esposa até o mercado no fim da tarde de ontem (8 de janeiro) quando nos deparamos, na praça logo no fim de nossa rua, a Plaza Encarnacion, em Atxuri, com uma quantidade significativa de pessoas paradas (e revoltadas) olhando para uma cena ridícula, mas extremamente comum em Bilbao e em todo o País Basco:

Coisa de meia dúzia de carros da Guarda Civil Espanhola, uns 10 guardas civis em volta de um cordão de isolamento que fechava o acesso entre a Plaza Encarnacion e a Bosque Bidea e em volta disso carros da Ertzaintza e da polícia municipal.

O objetivo era prender um dos 8 advogados ligados à EPPK, o coletivo de presos políticos bascos que não faz uma semana deu passos concretos para a paz no País Basco. Mas a Espanha não quer paz, os franquistas do PP não querem paz.

Em outras partes de Bilbao, como na Calle Elcano, houve agressões por parte da Guarda Civil e Ertzaintza contra quem se manifestava contra as prisões arbitrárias.

Demos a volta no cordão para ver o que se passava do outro lado - naquele momento ainda não sabíamos do que se tratava o cordão de isolamento e a presença dos espanhóis -, e estávamos justo na Bosque Bidea, perto da estação de trens de Atxuri quando um homem descia a ladeira em nossa direção em seu carro e, passando devagar, disse algo em voz alta em direção a uns 3 guarda-civis que estavam parados com fuzil na mão e cara de poucos amigos.

Disse algo como "vão pra casa", em clara referência ao fato de serem espanhóis à serviço do PP invadindo o País Basco, prendendo seus cidadãos e violando seus direitos.

Imediatamente dois deles foram rápido em direção ao carro, que tinha parado no sinal logo à frente, na Calle Atxuri, e começaram a discutir. Comecei a gravar a ação com o celular, ao que o terceiro guarda-civil me mandou parar.

Acostumado com o morde e assopra da PM brasileira, que sempre nos manda parar de gravar e depois nos esquece quando não o fazemos, disse que era jornalista, me afastei e continuei a gravar.

A cena era ridícula, dois guardas fortemente armados, um empoleirado na janela do carro e outro na frente bloqueando a passagem, fazendo ameaças (não era possível ouvir, senão ver a atitude deles), e o homem no carro tentando avançar e desviar dos guardas ameaçadores.

Um deles então enfiou a mão pela janela tentando agarrar o homem que felizmente conseguiu acelerar e fugir.

Raivosos, vieram em minha direção e tentaram tomar meu celular, gritando que eu não podia gravar e que seria preso. Informei ser jornalista e brasileiro (apenas o segundo fato me livrou da cana certa), e democraticamente me forçaram a apagar o vídeo e me ficharam.

Um adendo, devo agradecer aos sindicatos de jornalistas brasileiros e seu corporativismo estúpido, mais interessados em garantir feudos com o diploma do que proteger jornalistas efetivamente. Meu vídeo poderia ter sido salvo caso eu portasse alguma identificação, coisa que os sindicatos brasileiros me negam - e a todos que não tem o diploma, mas arriscam mais o pescoço que toda a direção sindical burocrática.

Fui, então, puto da vida, fazer minhas compras e me informei que a ação era parte de algo maior, da prisão de oito advogados nacionalistas por toda a cidade. Fizemos compras, voltamos pra casa e o cerco continuava.

Depois de um tempo decidi pegar minha câmera e ir até a Plaza Encarnacion, logo no momento em que uma prisão era efetuada, enquanto pessoas gritavam palavras de ordem e de apoio ao advogado que estava sendo preso e crescia o efetivo repressor no entorno mas, felizmente, não agrediram ninguém.
Como escrevi para o Opera Mundi esta semana:
Após uma manifestação em Durango, na região de Bizkaia, no meio da semana, 63 ex-presos da ETA, e membros do EPPK, em liberdade (uma parcela de presos políticos foi recentemente libertada após a derrogação da Doutrina Parot, mas 527 ainda permanecem presos na Espanha e França) tornaram público um documento no qual reconhecem os "danos multilaterais" do Conflito Basco, abrindo caminho para o reconhecimento que não apenas o Estado, mas também a luta armada causaram danos e sofrimento.
E foram além, afirmando que, baseados em decisão coletiva, iriam buscar saídas individuais para a redução de suas penas e para que possam ser transferidos para cadeias mais próximas do País Basco. Em outras palavras, a declaração do EPPK dá luz verde para que os presos possam aceitar benefícios penitenciários de forma individual, algo que até o momento era considerado ato de traição e passível de expulsão do coletivo.
Esta declaração foi vista por muitos analistas como a aceitação por parte do coletivo de presos políticos do sistema penal espanhol e uma forma de pressionar o governo, hoje nas mãos do Partido Popular, de ideologia próxima ao Franquismo, a dialogar.
A ação espanhola se insere no contexto do interminável conflito basco, interminável por parte da Espanha, obviamente, que se recusa a dialogar e reconhecer os passos dados pela Esquerda Nacionalista e pela ETA.

Qual seria o sentido de prender 8 advogados de presos políticos ligados ao EPPK menos de uma semana depois deste coletivo ter declarado que aceitará o sistema legal espanhol e que se submeterá a ele? A resposta é simples: A guerra contra os bascos garante mais votos ao PP que a paz. E também ao PSOE, que fique claro.

Enfim, a violência policial e judiciária espanhola é conhecida e reconhecida. Dei sorte, mas o que eu sofri não é nada comparado à violência diária a que são submetidos os bascos. É fácil compreender o ódio que muitos sentem não só da Guarda Civil, que age como um exército colonial de ocupação, mas contra a Espanha, que controla esse exército.

Fosse eu basco, estaria preso. Acusação? Gravar um vídeo. Poderia, como centenas de bascos ao longo dos anos, ter sido torturado e/ou "desaparecido", como Jon Anza e outros. O destino dos bascos está inteiramente nas mãos da Espanha e, dessa forma, passos adiante da esquerda nacionalista no caminho da paz e da autodeterminação são tratados como ofensa, como crime.

Imaginem só como é viver assim. A lei não existe para a Guarda Civil, ela faz a lei e é a lei.

Atividades políticas, exceto as dos fascistas PP e PSOE, são criminalizadas, condenadas e qualquer cidadão basco pode ser preso, torturado, "desaparecido" e morto apenas por protestar contra sua situação e a situação do seu povo.

Mais fotos da prisão em Atxuri: http://www.flickr.com/photos/48788736@N03/sets/72157639561866494/

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Atualização:

Ontem ocorreu uma pequena manifestação no centro de Bilbao contra as prisões arbitrárias dos advogados do EPPK, gravei um vídeo e tirei algumas fotos.
 
A "justiça" espanhola, via um juiz que é ex-conselheiro do fascista PP, Eloy Velasco, PROIBIU a manifestação de amanhã em Bilbao convocada pelo coletivo Tantaz Tanta (Gota em gota).

No entanto, as esperadas mais de 50 mil pessoas devem comparecer à manifestação de qualquer forma, permita ou não a Espanha.

O mesmo juiz fascista do PP passou por cima da imunidade de um senador nacionalista basco e mandou a polícia invadir seu escritório. O senador do EH Bildu, Goioaga, é também advogado de presos políticos. Seu escritório goza de imunidade.

Pro PP não importa.

Sinto que o protesto de amanhã será um dos maiores da historia do País Basco. O PP só contribui para que cresça o ódio contra a Espanha.
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