segunda-feira, 11 de março de 2013

A esquerda continua não precisando aprender nada com os evangélicos

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Escrevi ha exatamente um ano, no Amálgama, o texto "A esquerda não deve aprender nada com os evangélicos", como resposta a um texto do militante petista [ele não é militante, como o próprio me informou, perdão pelo equívoco] @Senshosp e, após todo este tempo, não mudo uma única vírgula, mas me sinto na obrigação de ampliar algumas ideias e o debate.

Eu disse então:
A esquerda não prega “salvação”, e nem diz ser caminho fácil. E uma ampla parte da direita pode ser nociva, mas não é a TFP ou a Opus Dei. É preciso ainda lembrar da quase neutralização da Teologia da Libertação que, pese críticas, era um movimento mais aberto e que, mesmo com preconceitos, buscava dialogar e não impor sua vontade.Ainda que religioso, ligado à Igreja, era um respiro que possibilitava o diálogo. O marginal da fé diz que basta rezar e… pronto. Paraíso terreno e além.
Ao invés de combater isso, cobrando impostos e legislando, o governo preferiu se aliar/perpetuar a farra dessa corja. O crescimento dela não se deve só a seus feitos, mas à inação de governo após governo e, agora, à aliança do governo com esses tipos. É óbvio que o crescimento vertiginoso dessas igrejas caça-níquel não se deve ao PT, mas tem sido ajudado, agora, pela clara aliança e troca de favores que existe.
No momento em que Marco Feliciano assume a presidência da Comissão de Direitos Humanos com apoio, via omissão, da direção do PT - que tinha "outros projetos" e cujos militantes acham que "questões comportamentais" não são importante - e que Malafaia passa a ser estrela desfilando homofobia - contando com o apoio, por exemplo, também via omissão, de Paulo Paim, relator do PLC 122, é preciso rediscutir o papel das seitas neopentecostais que professam a "Teologia da Prosperidade" - e incluo aí Malafaia e Feliciano, que são da Assembléia de Deus, em tese, Pentecostais e não NEO pentecostais - e também o papel do partido do e no poder, o PT, que não apenas se aliou, como deu forças a estes grupelhos radicais e, de fato, deixou de ser esquerda há muito tempo, adotando uma agenda tucana de privatizações e compensações deixando apenas migalhas aos pobres e, muitas vezes, migalhas de qualidade duvidosa (vide UniEsquinas, por exemplo).

A esquerda não deve, mantenho, aprender NADA com os Evangélicos, a não ser aprender a não copia-los, ou seja, aprender a não cometerem crimes como estelionato, curandeirismo e semelhantes. E repito, quando me refiro a "evangélicos", não generalizo todas as dezenas (centenas?) de denominações tradicionais, como Batistas, Calvinistas, Luteranos que, apesar de merecerem críticas tanto por discursos deslocados e conservadores quanto por não reagirem à invasão neopentecostal, são sérias e não tem o estelionato como prática cotidiana e única base de sustentação.

Basta observar, por exemplo, o abaixo assinado de uma rede evangélica que reúne igrejas tradicionais e pentecostais que se opõem ao fanático Feliciano. É preciso separar as NEOpentecostais acrescidas das dissidências da Assembléia de Deus (Feliciano, Malafaia...) das demais.

É óbvio que, retomando o texto original, a esquerda não deve aprender nada com os evangélicos, mas deve sim aprender com suas próprias falhas e erros, sair do mundinho hermético da linguagem marxista-acadêmica, das brigas de diretórios e chegar efetivamente no povo, no movimento social e CONQUISTAR estas pessoas com um discurso coerente e possível.

Não adianta chegar para quem tem fome e dizer que na Revolução tudo será resolvido. A revolução não virá amanhã e nem depois, logo, o discurso acaba frouxo, deslocado e não é atrativo. E é aí que os evangélicos ganham a jogada: Oferecem o "sucesso" rápido. Seja material, afetivo, psicológico (em geral material, o que levaria ao resto), eles oferecem um pacote de maravilhas desde que você siga certas "regrinhas" que, descontextualizadas e interpretadas da forma mais conveniente ao pastor, apóstolo, profeta ou bispo(a), acabam por combinar com preconceitos emraizados e até adormecidos ou "domesticados" e está feita a desgraça, está conquistado o "fiel" desesperado por melhoras em suas condições e disposto a aceitar/dar tudo pelo "sucesso", pela "vitória em Cristo"!

Compreender, porém, como se dá a "conquista" no campo evangélico é difernete de dizer que devemos copiar ou mesmo aprender com eles, pelo contrário, devemos ter um discurso e um conjunto de práticas estruturadas para COMBATER este discurso e, ao menos tempo, renovar o nosso.

Voltando ao "presente", vejam qualquer vídeo de Feliciano e seu "Stanley comunista e nazista" ou Malafaia querendo "funicar" alguém, ou Bispos, Bispas, Apóstolos e profetas de seitas maiores ou menores prometendo curar tetraplégicos, cegos, surdos e doentes de todos os tipos com apenas uma simbólica doação de mil reais, ou através da compra de uma "toalhinha ungida" ou de um tijolo de plástico por 500 reais.

E não tem problema se você não tiver dinheiro, basta pagar parcelado ou, para os mais corajosos, ENTREGAR o cartão de crédito ao honesto pastor (mas não esqueça de dar a senha!).

Parece engraçado - não deixa de ser - mas são perigosos.

Buscam especialmente entre as camadas mais pobres da população por aquele sem desespero, em situação financeira ou psicológica complicada, vulneráveis. E com o crescimento do poder aquisitivo da população - que não vem acompanhado de educação de qualidade, cultura, lazer e etc - os Marginais da Fé, pastores caça-dízimo, encontraram terreno fértil e propício para lucrar.
Estamos falando de, talvez, 20% da população – não há ainda dados conclusivos divulgados pelo IBGE que sustente esse número. E estes 20% têm pautado os demais 80%. Temos tido retrocessos gigantescos em áreas onde 20% dita as regras contra o resto da população e contra outras minorias igualmente significativas. Dilma mente ao dizer que governa para todos, quando na verdade vemos claramente que governa para e comandada por uma minoria em detrimento do resto da população. E dizer que “o brasileiro médio é conservador” não justifica recuos que contrariam as noções mais básicas de direitos humanos, marco sob o qual devem ser fundadas todas as relações humanas e entre o Estado e seus cidadãos.
Conseguiram uma população altamente consumista via investimentos estatais, mas ainda vulnerável social e psicologicamente às suas investidas. Não são 300 reais que alterarão a condição social e de classe e, muito menos, os fatores psicológicos que os levam à "necessidade" de buscar refúgio no obsurantismo neopentecostal.

É óbvio que o discurso neopentecostal dos Marginais da Fé não vem do nada, ele se alimenta dos preconceitos da própria sociedade, mas o potencializa, canaliza, dá forma a um ódio abstrato, por vezes guardado e apenas liberado em expressões populares, dizeres, mas que apesar de terem efeito imediato em alimentar o preconceito, tem alcance limitado em termos práticos, como na alteração de políticas públicas ou, como com Dilma, na aniquilação de políticas até consagradas, como no combate a AIDS junto à população LGBT.

O abandono do PNDH3, os recuos vergonhosos no programa Escola Sem Homofobia (o famoso Kit Gay) e outros retrocessos visíveis e mesmo a proibição sequer de uma ministra das mulheres de falar sobre o Aborto são a cara da influência evangélica nociva junto ao Estado.
As ações do governo para privilegiar uma casta religiosa conservadora, rica e que chegou lá por meios extremamente obscuros, como os vetos a toda e qualquer campanha para o público LGBT, ou pelo tratamento da questão do aborto como problema de saúde pública, dentre outras, denunciam a escolha feita pelo governo e não o fim das disputas e dos combates em busca de um Estado Laico.
Malafaia hoje se alia com políticos (com o PMDB do Rio, por exemplo) e influi em eleições. A IURD fundou partido e hoje integra a base do PT e tem até Ministro (Crivella, na Pesca, o que não deixa de ser irônico). Valdomiro mexe pauzinhos nas eleições. A Renascer deixa claro quem apoia e diversas denominações lançam - e elegem - candidatos para formar a medievalista Bancada Evangélica (inclusive o PT está no bolo). O PSC é basicament eum partido formado por pastores, pastoras e... profetas! E temos o minúsculo PEN que paga de ecologista, mas não passa de legenda de aluguel para krents.

Em suma, pastores e líderes de seitas de tamanhos variados usam e abusam do espaço que tem na mídia, com a compra de TV's, rádios, jornais e revistas - tudo com o dinheiro roubado de "fiéis", pessoas em geral vulneráveis e influenciáveis - para influenciar também eleições, políticos e governos.

Mas, como não são burros, mais fácil que influenciar políticos é serem políticos e usar toda sua força - leia-se voto de cabresto - para conquistar vagas e ter força suficiente para influenciar nas decisões dos grandes partidos.

É pernicioso e mesmo desnecessário tentar discutir se os evangélicos conservadores e nocivos são fruto da sociedade ou se acabam moldando a sociedade usando de preconceitos por vezes adormecidos ou amortecidos, transformando causas que em muitos casos passariam despercebidas em cruzadas morais.

Possivelmente há um pouco de cada coisa.
Temos de combater este estado de coisas, e, acreditem em mim, não faltam religiosos, mesmo do campo evangélico, que seriam aliados de primeira ordem, que são laicos e se opõem de forma veemente a estes que prometem os céus mediante pagamento no cartão em suaves prestações e que, no meio tempo, pregam o ódio e usam o povo como instrumento de sua vingança contra a humanidade.
Da mesma forma é absurdo dizer que os pastores e outros krents e Marginais da Fé são eleitos, logo, são legítimos representantes, pois isto significa esquecer que há voto de cabresto, que seitas cristãs usam e abusam do dinheiro que roubam de fiéis vulneráveis, que estas seitas se aproveitam de rádios e TVs que conseguem com o dinheiro que roubam e por aí vai....

O fato é que são poderosos, influenciam políticos e hoje são políticos. E isto é inaceitável.

Neopentecostalismo não é cristianismo, é uma seita (ou conjunto de seitas) de bandidos que usam o cristianismo para atrair e saquear. Usam e abusam de discurso messiânico e curandeirismo usando sua lábia e influência (e uma dose gigantesca de medo) em populações vulneráveis, mas que vem ascendendo socialmente (mesmo que timidamente) e garantindo uma constante engorda nos bolsos de lideranças.

E o medo é o principal combustível destas seitas, medo do inferno, medo da sexualidade e medo dos diferentes, dos que não compartilham do mesmo modo de vida hipócrita de submissão e obediência cega.

Em termos de soluções ou ao menos de um possível caminho para neutralizar a onda neopentecostal medievalista que toma conta do país com apoio e entusiasmo porp arte do governo do PT, as apresentei ha algum tempo:
Uma democratização das comunicações, com o fim de concessões a igrejas e pastores, a proibição de programas de tele-evangelização (a venda de horário de concessões públicas em si é contra a lei, logo, vender horário para igrejas não deveria ser tolerado) e a ampliação da internet (e não a piada do PNBL entregue para as teles lucrarem com serviço pior que o que já oferecem), seria de grande ajuda, mas nada foi feito. Ampliar o alcance e a qualidade da educação pública, melhorando salários de professores e os preparando melhor para a profissão seria outro passo importante, assim como dar dignidade à população que, muitas vezes, recorre a esses marginais da fé por puro desespero de suas condições sociais e econômicas.
São ações iniciais.

É preciso cortar o mal pela raiz. Acabar com espaço em rádios e TVs de curandeiros e estelionatários, mas acima de tudo, é preciso impor a taxação - e taxação pesada - sobre estas organizações mafiosas. A partir do momento em que Malafaias da vida precisarem declarar impostos, as coisas começarão a mudar.

Mas nem as ações básicas são levadas a cabo pelo governo, pelo contrário. A homofobia é promovida pelo governo e pessoalmente pela presidente Dilma, que não esconde seu preconceito e desprezo pela população LGBT, os direitos das mulheres são penhorados em troca do apoio dos conservadores e isto sem sequer mencionar os massacres contra índios, remoções forçadas de populações que são chamadas de Classe C, mas não tem sequer a segurança de que terão um teto no fim do dia, e a política do pão e circo foi institucionalizada.

A luta contra o neopentecostalismo e o medievalismo, que são irmãos, é, para usarmos termo caro ao governo e seus apoiadores, a luta pelo progresso. Mas não apenas o progresso econômico que mascara nossa desigualdade e problemas crônicos, e sim o progresso social. Um povo educado torna-se menos vulnerável às investidas de engravatados com bíblias debaixo do braço e tem a capacidade de discernir religião de ódio, charlatanismo e estelionato.

A esquerda não deve, enfim, aprender nada com os evangélicos - neopentecostais -, mas deve combatê-los, com unhas e dentes, lutando pelos direitos das minorias, pelo Estado Laico, pelo direito à educação, cultura, lazer e condições sociais decentes para toda a população, ou seja, a esquerda deve se manter como esquerda, garantindo o respeito às suas bandeiras históricas e não cedendo em nome de uma suposta governabilidade que, no fim, serve apenas aos propósitos de krents, banqueiros, ricos e aproveitadores de todos os tipos.
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Agradecimentos ao futuro pastor e amigo @Paiva_thiago pela consultoria inestimável e eterna paciência!
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Atualização:

Declaração de Crivella, da IURD e MINISTRO do governo, sobre sua querida presidente:
"A nossa presidenta e o presidente Lula fizeram a gente crescer porque apoiaram os pobres. E o que nos sustenta são dízimos e ofertas de pessoas simples e humildes", disse Crivella durante um evento da Convenção Nacional das Assembleias de Deus - Ministério Madureira, em São Paulo. "Com a presidenta Dilma, os juros baixaram. Quem paga juros é pobre. Com menos juros, mais dízimo e mais oferta."
Precisa dizer mais alguma coisa?
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