sábado, 5 de novembro de 2011

Legitimidade: Apoiar a Ocupação na USP?

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Em post anterior, deixei clara minha posição de repudiar a presença da PM no campus, a posição de estudantes de direita ou simplesmente com preguiça de raciocinar e, claro, a posição do Reitor, mas, ao mesmo tempo, critiquei a atitude radical (beirnado a boçal) e intransigente de uma parcela dos estudantes que andam em círculos, repudiando a PM, mas não dando uma soloução que satisfaça o coletivo.

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É preciso colocar que o DCE apresentou propostas, ao mesmo tempo em que repudiou a reitoria e se mostrou contrário à ocupação.
Uma reivindicação histórica do movimento estudantil é a ampliação do efetivo da Guarda Universitária, o fim da terceirização da Guarda Universitária (tem uma rotatividade grande na segurança na USP), que ela tenha um papel preventivo e não repressivo, que receba treinamento em direitos humanos e criação de efetivo feminino pra lidar com os casos de assédio sexual e estupro, que ocorrem as dezenas e são abafados. Também melhora no sistema de iluminação (promessa que não sai do papel), ampliação da circulação no campus através dos ônibus circulares que têm em número restrito (por exemplo, não existe ônibus que vá do campus até a estação de metrô, como prometido), a ampliação do número de vagas de moradia no campus, pq ajuda a dinamizar a vida universitária, e o fim das restrições da circulação, porque o que aumenta os casos de violência é o fato de o campus ser um lugar ermo. 
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Durante a confusão, estudantes invadiram a direção da FFLCH sem nenhum tipo de consulta aos demais alunos sequer da faculdade (apenas cerca de 500 estavam presentes em uma espécie de assembléia que decidiu pela ocupação inicial) e, de quebra, mantiveram a ocupação apesar de uma assembléia posterior, mais ampla, ter votado contra.

A posição do DCE da USP, aliás, também é contrária à ocupação, que se mostra ilegítima frente à maioria dos estudantes.

Um grupo de ultraesquerdistas (MNN, PCO e LER), se apropriou das legítimas bandeiras e reivindicações dos estudantes e tomou para si a (ir)responsabilidade de manter a ocupação e a direção do movimento.
Uma assembleia realizada na noite de terça-feira (1º de novembro) votou pela desocupação do prédio administrativo da Faculdade de Filosofia (FFLCH), iniciada no começo de sexta, 28 de outubro. Mesmo assim, manifestantes iniciaram outra reunião, com quórum menor, e votaram pela ocupação do prédio da Reitoria – invadida minutos depois.
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Infelizmente, um setor minoritário do movimento, derrotado nesta votação, agiu de forma antidemocrática ao ocupar a reitoria, deslegitimando o debate feito no fórum de assembleia. A gestão do DCE-Livre da USP entende que tais práticas deslegitimam as instâncias do movimento e não contribuem para uma atuação consequente, democrática e de luta. É necessário que haja unidade do movimento estudantil para combatermos o projeto privatizante e excludente realizado pelo governo estadual e pela reitoria.
Mas, frente à possibilidade da PM intervir - à pedido do sempre ditatorial Reitor Rodas e da conivente justiça de São Paulo - muitos militantes passaram a dar seu apoio à ocupação.

Pois bem, eu discordo da forma e explico.



São coisas diferentes apoiar a ocupação em si (ilegítima) e apoiar a resistência dos estudantes frente à possibilidade de violência policial (legítima). É diferente dizer "apoio a ocupação" e "apoio a ocupação ENQUANTO houver ameaça de violência".

É preciso pontuar as condições que levam ao apoio (ameaça de violência) para que não se apsse a imagem de que um grupo pode falar por todo o coletivo a todo momento, sem consulta ou desrespeitando consultas.

Mas é preciso deixar ainda mais claro o repúdio à brutalidade policial que se avizinha e que também já foi sentida antes e à ditadura que Rodas impôs à universidade.

Me coloco junto àqueles que não apoiam a ocupação em si, mas defendem o direito dos estudantes se manifestarem e de exigirem que a PM se retire do campus e que, obviamente, não haja violência.

O ideal seria uma negociação entre reitoria e alunado, mas sabemos que há intransigência em ambos os lados, mas há também uma força policial por detrás de um deles, então caberia aos próprios alunos convencerem os intransigentes a compreender que manter esta ocupação em nada ajuda nas reivindicações estudantis.

Se, por um lado, a ocupação inicial, feita às pressas, pode ser desculpada pela necessidade imediata de ação e de se protestar, por outro pode-se afirmar que serviu para denunciar e fazer sair da toca uma direita raivosa que existe mesmo denro da USP, mas especialmente na mídia e entre os chamados "cidadãos de bem".

A primeira movimentação dos estudantes serviu para demonstrar o isolamento que existe entre uma comunidade acadêmica contestadora e parte de uma sociedade conservadora, mas a continuidade da ocupação passando por cima mesmo do alunado contestador pode apenas alienar mesmo outros setores que vem apoiando a resistência dos estudantes.
É necessário dar consequência política a este movimento. Do contrário, o isolamento não permitirá nenhuma conquista real para os estudantes da USP, mas sim desgastes, conflitos e enfraquecimento. Por isso, chamamos todas e todos para que se envolvam no processo, discutam com os estudantes de seus cursos e participem ativamente da construção de uma saída coletiva para o impasse que a reitoria tem criado em nossa universidade.
Em resumo, a ocupação inicial serviu para desmascarar a direita raivosa, mas a continuidade sem legitimidade só serve para alienar apoio e criar um abismo mesmo entre a esquerda.

Não está em discussão aqui a legitimidade da PM de ire até a FFLCH descer o cacete nos alunos com total conivência da justiça do estado tucano, esta não existe em absoluto. O que se discute e afirmo é que, enquanto movimento estudantil, os ocupantes não tem legitimidade, mas são estudantes e não podem ser reprimidos.

O acirramento dos conflitos na USP, tanto dos estudantes contra a reitoria, mas também de estudantes contra outros estudantes não interessa ao coletivo da Universidade, mas tão somente ao grupo dirigente.
Para além da polêmica em torno da ocupação da Reitoria, me parece que estão em jogo nessa questão três aspectos que têm sido muito pouco abordados. O primeiro refere-se à estrutura de gestão dos processos decisórios dentro da USP: quem e em que circunstâncias decide os rumos da universidade? Não apenas com relação à presença da Polícia Militar ou não, mas com relação à existência de uma estação de metrô dentro do campus ou não, ou da própria política de ensino e pesquisa da universidade e sua relação com a sociedade. A gestão da USP e de seus processos decisórios é absolutamente estruturada em torno da hierarquia da carreira acadêmica.
Não se pode abandonar quem se coloca na rota da violência policial, mas seria saudável que a própria comunidade acadêmica e em especial a esquerda da FFLCH chegasse a um acordo e encontrasse uma forma mais madura e efetiva de combater tanto a PM no campus quanto a gestão ditatorial do Rodas.

Ou seja, todo apoio à resistência frente à ameaça de violência policial, mas passado o perigo, os estudantes devem tomar de volta para si as rédeas do processo enquanto conjunto e não enquanto uma minúscula vanguarda iluminada.




*Artigo que nasce de discussão com Lucas Morais (@Luckaz).
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